"(...) Lugar de passagem entre os Vales e o Tortosendo, não existe monografia que garanta as suas origens, mas há quem diga que os de Alcaria, em época estival, ali vinham, atravessando os seixos de um Zêzere seco, quase dois quilómetros por salgueirais e caminhos de cabras, em busca de um fio de água, da pouca que, num extremo da aldeia, envergonhada entre muros naturais, saciava as gentes do Dominguizo em vagas de cântaros sucessivos para que, ao menos, se não morresse de sede.
De resto, pouco mais razões haverá que tenham justificado o parto em tal zona. Seja como for, nascido o rebento, com uma casa aqui outra acolá, em atitude de heróico povoamento, logo o combate se empreendeu para que as gerações ali se pudessem fixar e sobreviver. E nestas coisas da batalha contra a morte, não é fácil dominar a vontade: se o solo é escasso, tenta-se o do vizinho e regressa-se apenas à noite ao caldo da família; se o meio não chega para todos, vai-se de terra em terra, saco às costas, num seja-o-que-Deus quiser; ou então emigra-se para o Brasil, que é país de árvores donde se colhem bons frutos.
(...) Festas grandes, quando as havia, eram aneiras para agradecer mercê recebida. E então faziam-se mesmo rijas: chegavam a ir, de Silvares, os do bombo, que rebentavam couros e tímpanos, ainda mal refeitos do foguetório matinal que Jaquim Badaladas, sacritão por obséquio, lançara no ar. Todavia, a aldeia, aos domingos, estava, a seu modo, sempre em festa no cimo do povo, onde, rapazes e raparigas, ao som do harmónio, bailavam sem detenças, enquanto os namorados mais sisudos passeavam estrada abaixo, estrada acima, ante o olhar das gentes de soalheiro."
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