"Em vinte e oito dias e meio por mês, em trezentos e quarenta e dois dias e meio por ano, Lisboa padece esta doença perigosa: a nostalgia da carne.
E querem ideias, querem carácter, querem músculos, querem força, querem bom senso, querem firmeza, querem vontade, querem opinião!
Ah! querem tudo isso? Dêem-nos carne.
Olhem-me para este habitante ... (...) Ele vem simplesmente do dia primeiro do mês antecedente e dirige-se lentamente para o dia primeiro do mês seguinte; ele vem do último jantar de carne, cuja memória se lhe perde confusamente, ao longe, nas brumas da história, e adianta-se para o jantar de carne do dia seguinte, oculto nas incertezas do futuro. Através de todo o seu trabalho mental, ele lembra-se vagamente de uma coisa - a carne, a saudade eterna, a permanente e roedora melancolia!
(...) Pois bem! propinem-se-lhe três costeletas por cada um dos trezentos e sessenta e cinco dias que tem o ano, com mais três costeletas suplementares para o exercício dos anos bissextos, duas dessas costeletas da espécie ovina ao almoço, uma da espécie bovina ao jantar, e ela desmedrará em sentimentalidade e em cuia tudo quanto adquirir em cor e em sangue.
(...) Mas não se pode ter tudo: pão e circo, costeletas e ociosidade, desordem e bife!"
Ramalho Ortigão
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