Breviários de Abril

Manuel Alegre

Eu vi Abril por fora e Abril por dentro
vi o Abril que foi e o Abril agora
eu vi Abril em festa e Abril lamento
Abril com quem ri como quem chora.

Eu vi chorar Abril e Abril partir
vi o Abril de sim e o Abril de não
Abril que já não é Abril por vir
e como tudo o mais contradição.

Vi o Abril que ganha e Abril que perde
Abril que foi Abril e o que não foi
eu vi Abril de ser e de não ser.

Abril de Abril vestido (Abril tão verde)
Abril de Abril despido (Abril que dói)
Abril já feito. E ainda por fazer.

Noël de Arriaga

... ... ... ... ... ... ... ... 
Liberdade de ter amantes
Em qualquer idade,
Tomando a pílula
Que a mocinha compra
No colégio ou nas farmácias
Da cidade.

Liberdade de ser socialista,
Surrealista,
Comunista,
Egocentrista,
Boémio ou artista,
De ser, enfim,
Tudo o que exista
E que dê na vista,
Menos fascista

Liberdade obrigatória
De acatar sorrindo
Os ventos da história

É dever urgente,
Publicamente manifesto,
De compor ou de cantar 
Uma canção de protesto!

Protesto contra Jean-Paul Sartre,
Ultrapassado
Hoje a moda é ler e decorar
Simone de Beauvoir.

... ... ... ... ... ... ... ... ... ..."

Miguel Torga

"Sombra dos mortos, maldição dos vivos.
Também nós ... Também nós ... E o sol recua.
Apenas o seu rosto continua
A sorrir como dantes,
Liberdade!
Liberdade do homem sobre a terra,
Ou debaixo da terra.
Liberdade!
O não inconformado que se diz
A Deus, à tirania, à eternidade.

... ... ... ... ... ... ... ... ... ..."

Vergílio Ferreira

"De vez em quando lá aparece um especulador intrigado por ter sido possível um tirano. Salazar. Estaline. Hitler. Enunciei algures uma verdade e é a de que numa carroça quem tem menos problemas é o cavalo. E todo o intrigante do problema está aqui. Há decerto vários motivos de circunstancialidade a ajudar. Mas no fundo a questão vem a cifrar-se à do cavalo na carroça. É o problema clássico do Grande Inquisidor. Ser livre é bom. Mas não ter chatices é melhor. E a liberdade tem imensas."