Achei. Achei não sei com que idade, mas estava na papelada que tinha ideias que cabiam numa folha A4, frente e costas, amarelecida pelo tempo, moribunda ... Trago-a hoje à ruadojardim7 não para lhe fazer uma espécie de boca a boca, mas para a oferecer à imaginação alheia que daqui se possa aproximar - sem medo dos olhares de uma qualquer secreta ...
- Chega ao aeroporto da Portela, de manhã, vindo de Nova Iorque. Vai direito ao escritório. É esperado pelo motorista. Beija à pressa a mulher e o filho.
- Sai do carro à porta de um imponente edifício da avenida da República, em Lisboa. O porteiro liga para o contínuo a comunicar o facto. A secretária é avisada. Consta que chegou: os contínuos avisam-se. Os directores perfilam-se e alinham papéis. "Chegou!"
- De manhã não vai receber ninguém. Lerá correio. Analisará propostas. Consultará a imprensa. Despachará com a secretária. "Não estou para ninguém!"
- O gabinete é forrado a chumbo e tem televisão para o exterior: domina visualmente a entrada do gabinete e respectivos acessos principais. Pode assim ter uma visão global dos diferentes serviços. O seu espaço é separado do da secretária pelo espelho (vidro duplo) que lhe permite "ver tudo" ...
- Reforça o não atendimento com o botão vermelho de OCUPADO. Fica anacessivel. Está prevista a análise dos aumentos do pessoal que não acontece "por falta de tempo..." Faz constar.
- À tarde, vai a uma reunião de trabalho com os colegas da administração. No dia seguinte, partirá de novo. Agora para S. Paulo.
- Entretanto, morre. Ou melhor: é encontrado morto. Descrever a propósito o que se disse nos corredores, "à boca pequena": telefonista, pessoal menor e outro.Referir o que os eventuais sucessores disseram à chucha calada ...
- É levado para casa - em segredo.
- Dá entrada no Purgatório. Não vai direito a S. Pedro, muito menos a S. Paulo (cidade).
- Tiram-lhe mal as medidas para a urna. Não cabe. É coxo. Disfarçava.
- No mesmo dia morre também um contínuo da empresa. Que vai para a capela mortuária ao lado da do ex-patrão.
- Troca de carros funerários e consequente preparativos: contínuo para um jazigo e patrão para enterrar. O que só se descobre quando se pretende abrir o que vai para a cova e se vê um caixão de chumbo.
Nota de rodapé: este projecto/grito de "discurso" foi abortado pela censura de que se falava à data desta espécie de borrão ...
Sem comentários:
Enviar um comentário