domingo, 10 de maio de 2015

Maestro José Atalaya - presente!












Biografia de JOSÉ ATALAYA
July 5, 2009 

PRIMEIRA PARTE

"(…) Nasci em Lisboa a 8 de Dezembro de 1927, junto ao Rossio, Terreiro do Paço, Foz do Tejo, rio de minha particular devoção desde sempre.
Quando ainda frequentava o Instituto Superior Técnico, impressionado com o êxito de Joly Braga Santos , procuro, aos 19 anos, o grande compositor e pedagogo Luiz de Freitas Branco (professor do então jovem sinfonista). Abandono de imediato a Engenharia. E de 1947 e até 1955, estudo, e apenas com ele, tudo o que viria a apreender nos domínios da análise, da composição e da história da música. Durante oito anos, o grande reformador pedagógico e figura central da música portuguesa do século XX, recebe-me não no seu estabelecimento de ensino, como fizera com Braga Santos, mas na própria residência. Com efeito, meses antes, Freitas Branco, vitimado por intromissões de raiz política, fora obrigado a afastar-se do Conservatório Nacional – no qual fora histórico autor, em 1919, com Vianna da Motta, da mais profunda reforma no ensino da música operada desde os tempos de D. João V.
O Mestre orquestrara para mim, como lição, em Novembro de 1955, a minha primeira obra. Escrevi-a para canto e piano, solução paradigmática ao alcance de quem começa. Inspirei-me em “As Mãos e Frutos” – livro que acabava de cimentar a aura nascente de Eugénio de Andrade. Seria apresentada música sobre poemas da obra máxima do poeta. Do seu último discípulo e em partitura orquestral do Mestre – que confiaria a regência a Pedro de Freitas Branco dirigindo a Sinfónica Nacional de que seu irmão era fundador e maestro titular.
Dias depois, creio que 17, nesse Novembro fatídico, morte (súbita) vitima meu mestre – único. Impressionado, desorientado e desgostoso com a morte do Professor e Amigo, prefiro afastar-me da Composição, interessar-se pela direcção de orquestra, enveredar pela musicologia etc… Viria, contudo, a retomar o seu gosto pela composição dez anos depois quando, após inesperado e breve fascínio pela controversa figura de Pierre Boulez (que entrevistei em Basel para a Emissora Nacional) – e que me induziu (marginalmente) a dirigir sem batuta “tenho dez batutas nos meus dedos “ dizia ele, aos seus discípulos, no curso de direcção de orquestra que ali regia de passagem. Eu ia a caminho de Hannover , depois virei para o Sul, Itália, onde conheci Pietro Grossi, o enorme violoncelista “clássico” que “se passara” para a vanguarda mais provocativa. Provoca espantanto na Itália inteira com os seus “cartões perfurados”. Faziam ouvir o melhor Bach sem músicos. Fundara no ano anterior em Florença o Estúdio de Fonologia Musical (S2FM). Tornara-se pioneiro naquele país das enormes potencialidades da Música Electrónica. Na Europa ia circulando através da associação que ele próprio fundou : Vita Musicale Contemporânea.
Grossi , ao saber dos meus antecedentes “electrónicos”, fecha-me no seu estúdio durante 15 dias, inclui-me no grupo dos seus primeiros discípulos e, no concerto anual desse 1968, 30 de Maio de 1968, no activíssimo Circolo Incontro, fez questão de injectar como penúltima peça daquele ímpio espectáculo, as minhas Variantes Rítmicas I sobre 4 sons sinusoidais . Realização que viria a ser, mais tarde, reconhecida como a primeira obra electrónica de autor português quando, por iniciativa de João de Freitas Branco, estas modestas “variações” acabariam por ser ouvidas em estreia lisboeta num concerto da Sociedade Portuguesa de Autores.
Mais tarde eu viria a preferir uma orientação diferente, na linha da Computer Music , apesar de não ter acompanhado Grossi na sua ida para os EUA, como seu assistente, devido (apenas, creio) à minha preparação científica. Bastante mais tarde – 1998 – em Lisboa, tenho o privilégio de que me cruzar (por mero acaso) com António Feio, reputado especialista em Portugal da Toshiba e que recolhia, todos os anos, na Alemanha, as inovações mais férteis daquela empresa, sempre na vanguarda do “computer” e das suas crescentes possibilidades à criatividade. Não apenas musical. O que reabre o meu caminho em direcção à hoje designada para música elecro-acústica. Tornou-se necessário ir fundamentando a nossa variante com a criação e implantação progressiva do Ensemble Improvisos XXI. Com ele, óbvio, e com Elizabeth Davis, percussionista solista da Sinfónica Portuguesa, premiada em Darmstadt (a Meca do vanguardismo europeu desde os anos 50). Em 2008 também aderiu ao “Ensemble” o compositor e pianista de carreira Bruno Belthoise, premiado pela Fundação França.
Outros percursos me conduziriam aos mais recentes CDs orquestrais: (…)
SEGUNDA PARTE
(…) Ingressei na Emissora Nacional em 1951 como assistente musical. Uma missão de serviço (gratuita) e uma Bolsa da Fundação Gulbenkian permitem-me frequentar cursos de direcção se orquestra com os maestros Félix Prohaska (Alemanha), Hans Swarowsky (interpretação dos clássicos vienenses), Igor Markevich e Piero Bellugi, discípulo deste último (e de Berstein) com o qual viria a terminar a minha formação de chefe de orquestra. Tornei-me membro fundador e director da Juventude Musical Portuguesa (presidida por Luiz e João de Freitas Branco), Noutra vertente (porque ainda não existia a Companhia Portuguesa de Ópera do Teatro da Trindade), fui também primeiro director e fundador do Grupo Experimental de Ópera de Câmara, criado e subvencionado pela Gulbenkian.
Tinha entretanto iniciado o capítulo didáctico mais importante de toda a minha vida. Estruturar com carácter permanente a Orquestra Clássica IMAVE (para o Instituto de Meios Audio-Visuais de Educação) por proposta do Ministério da Educação. Objectivo aliciante: concertos didácticos comentados em palcos de escolas, no secundário e nas Universidades. De 1966 a 1974, foram, todas as semanas, transmitidos pela ex-Emissora Nacional e pela Radiotelevisão Portuguesa. Estas sessões pedagógicas passarem a convergiam, aos domingos, para o Teatro Nacional de São Carlos repletas de estudantes e professores. Mais tarde, também, para as manhãs do Rivoli no Porto. Na FNAT para todo o público.
Esta acção de enorme responsabilidade tivera origem nos programas de divulgação musical iniciadas nas emissões experimentais televisivas na Feira Popular (Setembro de 1956 – “Música e Artistas” com Leonor Prado e Nella Maissa). Prosseguiram em 1957, na seguir na RTP já oficializada. Em 1974, devido aos acontecimentos ocorridos em Portugal, são interrompidas a Rádio e Televisão Educativas emanadas do Ministério, assim como o projecto de recuperar o antigo Gabinete de Estudos Musicais, criado pelo meu antecessor na EN, Pedro do PRADO. Por designação do seu então presidente, Clemente Rogeiro, eu passara a chefiar um novo Gabinete de Música Portuguesa, especialmente destinado a encomendar partituras sinfónicas aos nossos autores. Caíram, portanto, naquele difícil mas libertador Maio de 1974, ambos os meus projectos de âmbito nacional (Ministério, EN/RTP) assim como eventuais consequências na carreira de regente sinfónico do concerto em 3 de Março desse mesmo ano, acabara de dirigir no Coliseu, Sem a Clássica do IMAVE, pela primeira vez, com uma das mais conceituadas orquestras europeias – a Philharmonia Orchestra, criada em Londres, em 1945, logo após a II Guerra. É preciso recordar que essa fabulosa Philharmonia fora criada por iniciativa de Walter Legge, E escolhera em Londres (e quase exclusivamente para gravar discos com os maiores intérpretes mundiais) alguns dos melhores músicos das extintas orquestras de máximo renome) dizimadas pela catástrofe. Veio a Portugal para proporcionar em Lisboa, no Coliseu, a integral (numa única semana) das nove sinfonias de Beethoven, regidas por diferentes maestros.
Reintegrado em funções directivas na Emissora Nacional, decorrido pouco mais de um ano (9 de Julho de 1975) passei a depender directamente da Administração. As tomadas de posição favoráveis ao seu regresso, assumidas pelos instrumentistas das duas orquestras sinfónicas existentes em Portugal (Lisboa e Porto) foram determinantes na minha nomeação (pelo MFA) de coordenador artístico das três orquestras da EN, o que me permitiu, no ano seguinte, e criar em Portugal, as “Quinzenas Musicais”. Ou seja promover, no São Luiz, através da RDP e da SEC, festivais dedicados, sucessivamente, à música de países diversos – comprometidos a organizar festivais idênticos (em público, rádio e televisão) com música e intérpretes portugueses. Foi sucesso nessas Quinzenas terminarem sempre com um extenso “non-stop” de 9 horas – dedicado aos músicos do país em causa – iniciativa pioneira então em Portugal, espectáculos globais e de grande afluência de público. Enorme variedade tímbrica e pedagógica, colocando no palco, e no mesmo dia, dezenas de artistas – modalidade dispendiosa mas que favorece muito a conquista de novos públicos, abre perspectivas aos intérpretes. Recentemente volta a expandir-se em Lisboa e Porto.
Em 1977, assumo com Maria João Pires, as comemorações beethovenianas ( 150 anos da morte do compositor, no exterior (por intervenção do pianista Orazio Frugoni) sou designado membro do Conselho Nacional da Música (UNESCO), e integro em Lisboa a comissão nomeada por Alarcão Troni para a elaboração da Lei de Bases da Educação e da Cultura. Ao demitir-me das ásperas funções de executiva (ao mais alto nível) em que coordenava três orquestra nacionais, fui nomeado, por iniciativa João Figueiredo, então presidente da EN director titular da Orquestra Sinfónica do Porto mais próximo da vivência da Música. Na qualidade de conselheiro artístico de “Lisboa, Cidade de Música”, com Nuno Abcassis e Gomes de Pinho, inicio as temporada anuais e regulares no S. Luiz , inauguradas com “A Mulher e a Música” , ciclo teatral com presença em palco de Graça Lobo, no desempenho em cada espectáculo, de figuras como George Sand, Clara Schumann, Cosima Wagner (filha de Liszt) com encenações de Carlos Quevedo, dedicadas, em sucessivas quinzenas, às vivências sentimentais e artísticas de Chopin, de Schumann, de Wagner e Liszt. Assim cheguei a comentar e dirigir no São Luiz oito espectáculos por mês (domingos e terças-feiras) quando estes prosseguirem (infelizmente, contra a minha opinião) sem a riquíssima componente teatral (por mais dispendiosa). Determinou contudo, esta alteração, a criação de Música em Diálogo (1982). Alastrou quatro anos depois Lisboa para Oeiras e Cascais (com Isaltino Morais e D’ Argent) onde ainda se mantêm (ambas) em 2009, com regularidade quase semanal, todos os anos, desde 1986. Tiveram repercussão em cidades, como Almada, Amadora, Seixal. Depois o Centro e Norte – Coimbra, Aveiro, Porto, Famalicão, Maia, Fafe, entre outras. Chegámos a atingir (exaustos) média superior a cem espectáculos anuais. Recitais e concertos de música de câmara, comentados no palco, e em que iam alternando, comigo, mais de 40 solistas portugueses – intérpretes consagrados e/ou jovens em início de carreira, na sequência do anterior projecto (difundido de 1966 a 1974). Realizados em palcos de autarquias, sem apoio dos media não pelos media, o que não lhes proporcionou visibilidade comparável à dos concertos IMAVE .
Na RDP, recusei a manter-me Orquestra Sinfónica da RDP-Porto, por se deixarem desguarnecidos os naipes da mesma. Aceite o pedido de demissão, e enquanto aguardava a nomeação para responsável pelo Programa 2 da EN, escrevi para a Plátano o meu primeiro livro dedicado à educação musical, A Cassete Azul. Institui no Programa 2 da RDP (1983) a prática de fazer preceder, com breves comentários didácticos e informais, de vários colaboradores, a quase totalidade da programação desse único canal clássico existente no país. Ao ser extinta em Onda Media a emissão diária do 2º Programa (de que eu fora um dos fundadores com Manuel Bivar e Silva Dias) pedi de novo demissão do meu lugar. Sem funções (e retido no biblioteca) pedi aposentação prematura. Aos 56 anos.
Em 1992, creio que devido à projecção nacional de Música em Diálogo, aceitei de Santana Lopes o convite de fundar para a SEC a Orquestra Clássica do Porto, com base nos instrumentistas da ex-Régie Sinfonia do Porto . Reeditei naquela cidade a tradição do concerto sinfónico semanal. Comecei por programar ciclos temáticos: integrais das sinfonias e concertos de piano de Beethoven, dos “concertos brandeburgueses” de J. Bach. Fundei, igualmente para a SEC, em 1994, a antologia discográfica Cinco Séculos de Música Portuguesa. Publicados cerca de trinta títulos, nos primeiros dois anos, incluindo editoras estrangeiras de renome, como a Philips, num disco de Jorge Moyano dedicado a Schumann por entender que “música portuguesa” deve abranger autores e os intérpretes maiores.

Em Outubro de 1995, no decorrer da polémica desencadeada pela necessidade de preservar as gravuras de Foz-Côa, e para suster a barragem que destruiria essa património “rezámos-lhe uma morte digna” (como disse não sei onde, talvez no Público que lhe dedicou página inteira). Em concreto, realização do Requiem de Mozart, ao ar livre, junto às paredes xistosas do Alto da Canada do Inferno, apoio virtual de arqueólogos. Com elementos da Orquestra Regional do Norte, solistas nacionais e do Coro da Universidade de León, dirigido por personalidade relevante de Espanha – Samuel Rubio .Apesar de lhe ter falhado o subsídio prometido por ambientalistas e arqueólogos, empenhados nessa (histórica) missa de defuntos, a barragem do Côa morreu mesmo.

TERCEIRA PARTE
Ano de 1998- O da fundação, com Linda Magalhães Abreu, da Academia de Música José Atalaya, em Fafe. Subvenção anual da Câmara Municipal. Em Novembro de 2000, com início naquela cidade depois de um Concurso de Canto Ibérico o Festival Raízes Ibéricas passa a integrar a Associação Cultural patrocinada por amigos muito próximos e em 2001, atinge os 70 concertos em 20 cidades, incluindo Galiza e Festival de León.
Em 2003, passamos a dispor de Orquestra própria. No ano seguinte, iniciam-se as gravações anuais de CDs para a Numérica, fazendo (sempre) alternar os maiores autores universais com compositores portugueses.
A partir de 2006, na recente e inovadora componente pedagógica assegurada pelos técnicos da Numérica, os discos da Orquestra Atalaya/Raízes Ibéricas, passam a conter de oitenta a noventa faixas, permitindo assinalar, com precisão, e em relação a cada obra, os respectivos primeiros compassos (ou os primeiros segundos) de cada um dos temas, desenvolvimentos. Em suma os passos mais expressivo e estruturais de cada partitura.
Objectivo: prosseguir e concluir , a partir desse ano, o plano nacional idealizado quatro décadas antes, em 1966, por António Leónidas, o histórico e incontroverso fundador do IMAVE (Instituto dos Meios Audiovisais de Ensino). Confiou-me então (Carlos Miguel Araújo, director da RTP) – em horário nobre dos media – a difusão, em todo o país, do gosto pela música orquestral. Desde 1973, as verbas elevadíssimas desses (semanais) concertos sinfónicos comentados emitidos pela Rádio e Televisão passariam a ser memorizados, e valorizadas, com os primeiros discos didácticos, obtidos a partir da inestimável colaboração da Valentim de Carvalho, ficando essa acção didáctica dirigida a escolas e universidae, dos horários e programações restritivas dos dependentes dos media. Projecto interrompido com a extinção do IMAVE.

QUARTA PARTE
A Pedagogia em Disco renasce na Numérica. Contem textos exaustivos, gráficos e dezenas de (exemplificações de todos os temas) respectivas variantes e desenvolvimentos. A primeira edição discográfica, de 1973, foi distribuída em escolas. Esgotada em poucas semanas, começou com a 5ª Sinfonia de Beethoven e a “Incompleta” de Schubert.
A segunda fase, a de 2007, com a Geografia Musical da Numérica. Objectivo pedagógico redefinido com Fernando Rodrigues, seu director. Ideia: escolher para cada CD, para cada DVD – as melhores, as mais divulgadas páginas universais (Bach, Mozart, Beethoven, Bartok etc.). Para as confrontar, em CD de qualidade (assegurada com a colaboração de Frederick Gifford) com os nossos autores, em gravações orquestrais e didácticas. Discos únicos, por enquanto, onde basta teclar o respectivo comando para alcançar (sem mais) qualquer das dezenas de momentos, os mais expressivos ou sectores vitais de cada partitura. Repetindo-os n vezes, se isso convier ao professor ou o melómano. Propício a conviver, em cada instante, com cintilantes fulgores geniais do património universal. Contendo (sempre) em cada CD, nesse confronto imediato e fácil, com o rosto de figuras (incluindo as nossas) consideradas incontornáveis na história da música. Entre outras, há já programadas obras de Carlos Seixas, Sousa Carvalho, Luiz de Freitas Branco, Lopes Graça, Armando José Fernandes, Joly Braga Santos (…) “


* Elementos biográficos contidos na Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, notas retiradas de Memórias, na linha das reflexões contidas do livro Labirintos da Música.

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