Além da “Casa de Portugal” que já existe em Henan, outras se seguirão em diferentes províncias da China. Quem o diz é Y Ping Chow. O emblemático líder da comunidade chinesa em Portugal reinventou-se como empresário e assumiu o desafio de divulgar a pátria adoptiva na República Popular da China.
João Paulo Meneses
"O mais conhecido dos chineses de Portugal está envolvido em dezenas de projectos, quase todos vocacionados para o negócio. Hiperactivo e resoluto, Y Ping Chow é hoje um bem sucedido consultor empresarial. Deixou para trás a tradição dos restaurantes de comida chinesa – vendeu os últimos aos funcionários por não ter tempo para os gerir – e voltou a olhar com olhos de ver para o país de onde saiu há quase meio século. Regressado recentemente de uma deslocação à China, o empresário fez o ponto de situação das várias iniciativas em que está envolvido. E no caso de Y Ping Chow, estar envolvido significa liderar.
PONTO FINAL – O consórcio PTCN Missão Empresarial Portugal-China foi anunciado há cerca de ano e meio. O que é que aconteceu desde então?
Y Ping Chow – A ideia do PTCN nasceu na sequência da primeira lei de atracção do investimento, ainda em 2011, uma lei que ajudei a fazer nascer, já que surgiu por proposta minha no âmbito do trabalho no Conselho das Migrações do Alto Comissariado para as Migrações. A lei estava incompleta e foi melhorada e, com as alterações, já havia condições para o sucesso. Criámos, com amigos, a PTCN para procurar atrair chineses para o visto gold.
PF – Mas num ano e meio já há resultados?
YPC – Têm vindo muitas empresas chinesas que querem fazer negócios, mas a PTCN está agora menos vocacionada para o imobiliário. Demos alguns passos importantes e posso referir a criação da primeira “Casa de Portugal” em Henan. Aliás, já recebemos contactos de outras províncias para abrirmos outras casas na China.
PF – O que faz essa “Casa de Portugal”. Com que objectivos foi criada?
YPC – É uma mostra de produtos portugueses, dos nossos associados, e são vendidos com exclusividade. Não temos apoios dos governos, nem de Portugal nem da China. São as empresas que suportam os custos. No caso de Henan, contamos com o apoio de uma empresa local interessada em importar produtos portugueses.
PF - Uma das ideias que apresentaram nessa altura foi a de um parque industrial em Guizhou , suja primeira pedra foi colocada, numa cerimónia oficial em Março de 2011. Avançou?
YPC – Não. Havia a promessa de apoios da União Europeia que não se concretizaram. Era um projecto muito ambicioso, grande demais, que vamos redimensionar para um projecto na área turística: estamos a tentar criar uma zona gastronómica internacional, com vários tipos de restaurantes de vários países, espectáculos e lojas. Já temos o terreno e o projecto
PF – Uma recente notícia do Jornal Tribuna de Macau dizia que estaria a tentar promover a dinamização de uma cidade chinesa no Seixal, ligada a Guizhou. Que projecto é esse?
YPC – Conheci o presidente da Câmara do Seixal e apresentei-lhe a ideia. Ele prometeu ajudar. Também esteve cá o secretário da província de Guizhou e gostou muito de Portugal. A ideia é criarmos uma aldeia com as várias – e são 35 – etnias que existem nesta província. Seria uma espécie de aldeia turística, de divulgação da cultura local, para os europeus conhecerem e visitarem.
PF – Mas é um projecto relacionado com o expediente dos vistos dourados?
YPC – Os investidores que vierem a entrar no fundo que vamos criar podem vir a estar interessados nisso, mas não é esse o nosso principal objectivo.
PF – Mas não tem trabalhado na área dos vistos gold?
YPC – Pessoalmente, não. A minha posição já não me permite. Mas tenho criado oportunidades para os nossos associados ganharem algum dinheiro. Uma coisa posso garantir: nos negócios feitos por nós, ninguém foi enganado. Posso também dizer que estamos a tentar criar um departamento na Liga dos Chineses para novos associados que entrem através do expediente dos vistos gold.
PF – Outro projecto que fundou, e de que é presidente, foi a Câmara de Cooperação e Desenvolvimento Portugal-China. Para que serve?
YPC – Queremos trabalhar com a China também institucionalmente e não apenas com as empresas ou associações.
PF – Mas o objectivo é ou não ganhar dinheiro?
YPC – Queremos divulgar a cultura de Portugal e da China, mas também criar oportunidades de negócio. É o caso do Conselho Empresarial do Tâmega e Sousa, nosso associado, que está a trabalhar na província de Guizhou. Mas não esquecemos outro tipo de cooperação, como aconteceu com o Instituto Politécnico do Porto, que fez, neste contexto, uma parceria com a Universidade de Guizhou.
PF – Na altura da assinatura do protocolo de criação da Câmara, em Outubro de 2013, esteve em Coimbra uma delegação da Câmara de Cantão e falou-se num acordo de cooperação entre as duas localidades....
YPC – Não sei o que se passa, sei que estou muito triste. As pessoas não imaginam como é difícil conseguir uma geminação na China. Mas na actual Câmara de Coimbra não encontro vontade de cooperar. O facto de o acordo ter sido assinado mesmo no final da anterior maioria faz com que o actual presidente não reconheça o convénio, o que é uma situação muito desagradável. Guangzhou convidou Coimbra para estar presente numa exposição internacional e não obteve resposta. Temos de ser nós a substituir a Câmara.
PF – Além da PTCN e da Câmara de Cooperação, há ainda a Liga dos Chineses em Portugal e, que me recorde, a Associação Industrial e Comercial dos Chineses em Portugal, ambas presididas por si. Não são entidades a mais? Às tantas ainda se confunde…
YPC – Sim, pode haver essa ideia, mas o benefício é de todos. O objectivo é sempre criar negócios com a China. Eu sou o centro dessas instituições e isso facilita. O que não acontece é andar cada um para o seu lado. É verdade que há muitas associações ligados aos chineses, mas em muitos casos parecem concorrentes uns dos outros. Nós somos um consórcio. Portugal precisa disto.
PF – Já me esquecia. Também é conselheiro da cidade-município de Tianjin…
YPC - Sim, sou o representante para a captação de investimento português para Tianjin, mas chegar lá é um patamar muito elevado para os portugueses, porque exige uma capacidade de investimento muito grande. Podíamos ter aproveitado a oportunidade quando comecei a falar cá de Tianjin, por volta de 1995, mas isso não aconteceu.
PF – Ainda tem tempo para ser empresário?
YPC – Entreguei os restaurantes aos empregados. Já não tenho tempo e o aumento do IVA na restauração complicou tudo. Mas ainda tenho alguns negócios, sobretudo de exportação. Exporto, nomeadamente, vinhos portugueses para a China.
PF – E também teve uma participação numa empresa que queria levar jogadores de futebol para a China…
YPC – Entrei no negócio porque me falaram dessa possibilidade, mas não percebo nada disso. Nem gosto de futebol. Está em standby. Aquilo é um espaço para profissionais.
PF – Recentemente soube-se que é um dos accionistas de um canal de televisão na Internet, dirigido à comunidade chinesa. Um projecto ambicioso que surge com que finalidade?
YPC- Pensámos num canal chinês para divulgar projectos e oportunidades na China. É uma forma de investir para depois poder vir a ganhar algum dinheiro. A CCTV Portugal irá juntar-se a outros projectos de televisão dirigidos a comunidades imigrantes, até chegarmos ao cabo. Mas depende de cada comunidade criar as relações com o país de origem para gerar oportunidades de negócio.
PF – Entre a primeira vez que falámos, já lá vão mais de 20 anos e agora, muito aconteceu na comunidade chinesa. Concorda?
YPC – Sim, os portugueses olham-nos cada vez mais como parte da família. Já não somos tão estrangeiros. Até eu estou farto de comida chinesa… (risos).
O amigo da China que tem passaporte de Taiwan
Y Ping Chow nasceu na província de Zhejiang mas, para além do passaporte português, o outro documento de viagem que possui é o passaporte de Taiwan, de onde é originária a sua mulher. Curiosamente, a Formosa nunca esteve nos seus planos de negócio: “Tenho boas relações com Taiwan mas também tenho boas relações com a Embaixada da China em Portugal. Já propus que uma das nossas associações no PTCN fique como representante de Taiwan”, esclarece.
A proximidade emocional a Taiwan e à República da China, garante, nunca lhe criaram problemas com Pequim e as autoridades chinesas: “Não. Até cheguei a ser conselheiro da Província de Zhejiang. Mas espero que um dia a China me troque o passaporte. Não quero é ficar sem passaporte chinês, porque é a minha ligação à China. Com o passaporte sinto que ainda sou chinês”, sublinha.
Um sinal de que as relações entre Y Ping Chow e as autoridades chinesas são excelentes radica no facto da Embaixada da China em Lisboa ter solicitado ao empresário que organizasse as comemorações dos 70 anos da vitória na Segunda Guerra Mundial e da resistência chinesa à ocupação japonesa: “Estamos a preparar uma grande festa e haverá já no final de Junho uma conferência na Assembleia da República”, diz Y Ping Chow ao PONTO FINAL.
O programa das comemorações não está fechado e prevê iniciativas em Aveiro, organizadas pela delegação local do Instituto Confúcio, e exposições fotográficas em vários concelhos de Portugal.
E Macau?
Y Ping Chow garante que tem “bons amigos em Macau” mas reconhece que não deu “especial atenção” aos negócios com o território: “Nem precisa. Macau faz muito bem as coisas sem mim”.
Das várias missões que organizou – para um lado ou para o outro – Macau nunca apareceu no roteiro: “Trabalho com várias regiões da China, mas estou a dar especial atenção às províncias interiores, onde posso fazer a diferença e conseguir resultados”.
Y Ping Chow vem regularmente a Macau, sempre que se dirige a Cantão, uma das cidades onde tem melhores contactos e com a qual a sua Câmara de Cooperação e Desenvolvimento tem vindo a trabalhar."
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