domingo, 19 de julho de 2015

Do lido, o sublinhado (78) - O MEU IRMÃO, de Reis Cabral (1)*

* Prémio LEYA 2014

Em jeito de "satisfácio":

O livro de Afonso Reis Cabral, que li, em dois dias seguidos (combóio Lisboa-Covilhã e Covilhã-Lisboa) foi-me oferecido no Natal de 2014 e ... e deixou-me agora "arrependido" de não o ter lido mais cedo, para mais cedo ter esse prazer: inúmeras vezes me senti levado, por exemplo, ao ambiente simples e carinhoso da CERCI de que fui voluntário - e senti, e vi os sorrisos mais sinceros, mais naturais que algum dia (exceptuando os da minha filha e da minha neta, em particular, enquanto crianças) usofruíra ... Mas ...

                DO LIDO, O SUBLINHADO (com vontade de o transcrever na íntegra ...)

                                                 in O MEU IRMÃO

"Lembro-me de quando ainda dormíamos no mesmo quarto e eu já estava encasulado na cama e não me apetecia tirar um livro da estante. Pedia-lhe para o ir buscar. A reacção era imediata, Saltava-me da cama como um soldado e estava pronto ajudar, só que chegava à estante e qual dos livros era, se havia tantos? O da direita; e ele percorria os olhos para a esquerda. O de cima; e ele esticava a mão para baixo. Mesmo à frente; e ele tirava o livro exactamente ao lado. Eu desistia e nos dias em que estava bem-disposto fingia ler o livro errado que ele me dera. Depois pousava-o e desligava a luz. No escuro, o Miguel rilhava os dentes de satisfação porque conseguira acertar no livro."

"Quando não há solução, enfrentamos a realidade, fazemo-nos homens. Adaptamo-nos. Sobrevivemos. Vencemos, lutamos, ou pelo menos somos derrotados em grande no combate que é a vida. Com o Miguel não se passa isso,
ele mantém-se no mesmo estado de espírito, à semelhança de um pássaro de asa partida que ainda salta para voar. Salta e magoa a asa."

"Choramingar como uma criança num corpo de homem, num corpo de muitos quilos. Choramingar assim e não ser uma criança, não ter quem o console, quem lhe diga que tudo ficará bem mesmo que não seja verdade. Alguma mãe que apesar de velha encoste as rugas à cara dele recomeçando uma cantiga de infância como se nunca a tivesse interrompido."

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