sábado, 30 de janeiro de 2016

Do lido, o sublinhado (79) - A ladroeira dos ministros

De autor anónimo

"Olhem para mim todos os ministros de el-rei, que ontem andavam a pé e hoje a cavalo; estejam atentos a duas perguntas que lhes faço e respondam-me a elas, se souberem: - Se os ofícios de vossas mercês dão de si até poderem andar em um macho ou em uma faca, quando muito, e suas mulheres em uma cadeira, como andam vossas mercês em liteiras e elas em coche? Se a sua mesa se servia muito bem com pratos, saleiro e jarro de loiça pintada de Lisboa, como se serve agora em baixela de prata, salvas de bastiões, confeiteiras de relevo? Não me dirão donde lhes vieram tantas colgaduras de damasco e tela, tantas bufetes guarnecidos, escritórios marchetados e com pontas de abadia em cima? Já que lhes não dá do que dirá a gente, não me dirão onde acharam estes tesouros sem irem à India, ou que arte tiveram para medrarem tanto em tão pouco tempo, para que os desculpemos ao menos com a vizinhança? Já sei, sem que mo digam: houveram-se como a raposa no galinheiro em que entraram. Cevaram-se não só no necessário, senão também no supérfluo. Não se contentam com se verem fartos e cheios como esponjas, querem engordar com acepipes; e por isso lançam o pé além da mão e estendem a mão até o céu e as unhas até o inferno, e metem tudo a saco, quando o ensacam, e são como o fogo que a nada diz - basta!"

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