"Levantei de manhã triste porque estava chovendo. (...) O barraco está numa desordem horrível. É que eu não tenho sabão para lavar as louças. Digo louça por hábito. Mas é as latas. Se tivesse sabão eu ia lavar as roupas. Eu não sou desmazelada. Se ando suja é devido a reviravolta da vida de um favelado. Cheguei a conclusão de quem não tem de pró céu, não adianta olhar para cima. É igual a nós que não gostamos da favela, mas somos obrigados a residir na favela.
... Fiz a comida. Achei bonito a gordura frigindo na panela. Que espetaculo delumbrante! As crianças sorrindo vendo a comida ferver nas panelas. Ainda mais quando é arroz e feijão, é um dia de festa para eles.
Antigamente era a macarronada o prato mais caro. Agora é o arroz e feijão que
suplanta a macarronada. São os novos ricos. Passou para o lado dos fidalgos. Até
vocês, feijão e arroz, nos abandona! Vocês que eram os amigos dos marginais, dos favelados, dos indigentes. Vejam só. Até o feijão nos esqueceu. Não está ao alcance dos infelizes que estão no quarto de despejo. Quem não nos desprezou foi o fubá. Mas as crianças não gostam de fubá.
Quando puis a comida o João sorriu. Comeram e não aludiram a cor negra do feijão. Porque negra é a nossa vida. Negro é tudo o que nos rodeia.
... Nas ruas e casas comerciais já se vê as faixas indicando os nomes dos futuros deputados. Alguns nomes já são conhecidos. São reincidentes que já foram preteridos nas urnas. Mas o povo não está interessado nas eleições, que é o cavalo de troia que aparece de quatro em quatro anos.
... O céu é belo, digno de contemplar porque as nuvens vagueiam e formam paisagens deslumbrantes. As brisas suaves perpassam conduzindo os perfumes das flores. E o astro rei sempre pontual para despontar-se e recluir-se. As aves percorrem o espaço demonstrando contentamento. A noite surge as estrelas cintilantes para adornar o céu azul. Há várias coisas belas no mundo que não é possível descrever-se. Só uma coisa nos entristece; os preços, quando vamos fazer compras. Ofusca todas as belezas que existe.
A Theresa irmã da Meyri bebeu soda e sem motivo. Disse que encontrou um bilhete de uma mulher no bolso do seu amado. Perdeu muito sangue. Os médicos diz que se ela sarar ficará emprestável. Tem dois filhos, um de 4 anos e outro de 9 mêses."
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