sábado, 16 de fevereiro de 2013

Do lido, o sublinhado ( 20 )













in Alguns poetas de 1958, por Jorge de Sena  (COLÓQUIO nº1)


"(...) Tem-se dito que o poeta (Ruy Cinatti) não evoluiu, que é ainda o mesmo poeta dos sonhos adolescentes de uma personalidade muito original; e  para muitas pessoas este livro (O livro do nómada meu amigo) constitui uma desilusão. Eu não creio inteiramente justa esta crítica. Antes de mais, eu não sei porque havemos de exigir evolução a um poeta, se por evolução entendermos que modifique ou transforme aquilo que é, para lá das transacções com o tempo e a vida, a sua personalidade fixada muito cedo. Se por evolução entendermos um aperfeiçoamento harmónico e rítmico de uma linguagem pessoal; se entendermos um acerto mais firme entre a expressão e todo um complexo contraditório ( só as personalidades muito insignificantes nos não parecem à primeira vista como confusas, obscuras, um pouco incertas*), maior nitidez na afirmação de uma visão do mundo - então este livro é de poemas evoluídos, de uma segurança admirável, que confirmam definitivamente a sua poesia como uma das mais notáveis dos últimos anos.

(...) E ao exigirmos (...) a Ruy Cinatti aquilo cuja ausência é afinal um dos característicos dramas da sua personalidade, corremos o risco de não ver em que medida essa personalidade se enriqueceu em humana amargura, em aceitação entre resignada e altiva do destino que as circunstâncias e ela mesma lhe talharam. E é esta a grandeza da sua poesia."


* "... confusas, obscuras, um pouco incertas". Lembro as irregulares visitas de Ruy Cinatti ao Jornal Novo, em Santa Catarina, Lisboa, onde, com um sorriso tímido, distribuía a toda a gente folhas policopiadas com poemas seus - e... e "desaparecia" ...


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