by Ponto Final |
Roberval Teixeira e Silva, professor de português na Universidade de Macau, investigou o comportamento dos alunos chineses na sala de aula.
O ensino do português em Macau recebeu ontem nota negativa do académico brasileiro Roberval Teixeira e Silva, docente da Universidade de Macau, que criticou a metodologia vigente por ser "extremamente tradicional e silenciadora".
"O sistema de ensino, em termos de conteúdo é muito pobre e é muito tradicional, o que impede que os alunos desenvolvam uma série de habilidades e competências como a de analisar e criticar", disse, à margem do IV congresso da Associação Internacional de Linguística do Português, que este ano se reúne em Macau.
O professor, que antes de vir para o território trabalhou no Brasil sobre as questões do ensino do português como língua estrangeira, destacou um "problema de metodologia e de postura em relação a novas possibilidades".
Entre 2006 e 2011, Roberval Teixeira e Silva observou e registou aulas de português em praticamente todas as escolas da cidade e entrevistou professores, alunos e funcionários, identificando esta "resistência muito forte à mudança".
"As pessoas estão muito presas a modelos tradicionais de ensino que se focam na gramática, no vocabulário e na tradução. Não saindo dessa tríade, claramente criticada e ineficaz, o trabalho não vai funcionar. Não adianta se o aluno esta exposto à língua portuguesa por uma hora ou por cinco horas por semana. A postura é extremamente tradicional e silenciadora", criticou.
Esta abordagem das escolas encontra eco numa predisposição dos alunos chineses para o silêncio, um factor que frequentemente causa estranheza entre os professores estrangeiros habituados a audiências participativas.
O "enorme silêncio" das turmas que encontrou na universidade acabou por motivar o docente a iniciar uma investigação sobre o tema em 2007 - além de tentar perceber junto dos seus próprios alunos o que os inibia, o académico passou um ano a acompanhar as aulas de português de crianças do 1º ano, com uma professora cuja língua materna era o cantonês.
Roberval Teixeira e Silva concluiu que o ‘silêncio chinês' é algo cultivado desde a infância, "projectado pelos professores, pelos pais, pelos colegas", já que "toda a gente assume que para se ser bom aluno é preciso ser assim".
"Fui percebendo que se o aluno não for solicitado directamente para falar [e se o fizer] é interpretado como sendo uma pessoa que quer aparecer, que não respeita os colegas e até o professor", explicou.
Esta é uma diferença substancial em relação ao ensino ocidental, onde se espera e valoriza uma postura oposta. "Na minha cultura de sala de aula, o silêncio mostra desconexão e desinteresse porque estamos acostumamos a construir alunos que precisam de superar o professor, colocar as suas perspectivas", lembrou.
No entanto, "o aluno chinês tem a ideia de que precisa de imitar o mestre, é uma forma de respeito e de atingir um patamar adequado e ideal para os seus objectivos", esclareceu.
Segundo o professor, a situação pode ser contornada através de estratégias na sala de aula, de modo a atribuir "papéis específicos" a cada aluno num contexto de debate.
O académico considerou, no entanto, que não é preciso uma preparação especial para ensinar alunos chineses. "Se um professor estiver preparado para a diferença, não precisa de se preparar para o silêncio", concluiu.
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