“Pretende-se sublinhar a legitimidade do Partido Comunista”by Ponto Final |
“Manter em mente a história com firmeza”. É a mensagem que o recém-instituído Dia da Vitória contra o Japão passa ao mundo, mas também aos jovens que entendem que ser patriota não significa obediência ao partido.
Iris Lei
A decisão do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional para a consagração do dia 3 de Setembro como Dia da Guerra de Resistência do Povo Chinês contra a Agressão Japonesa destina-se a mais do que animar o espírito patriótico. Os objectivos prendem-se também com o actual quadro internacional e com a legitimação do governo pelo Partido Comunista Chinês, entendem académicos.
Depois de ter direccionado para a Ásia a política externa dos Estados Unidos, em 2011, o Presidente norte-americano, Barack Obama, visitou em Abril o Japão, a Coreia do Sul, a Malásia e as Filipinas, países que mantêm disputas territoriais com a China. Os críticos entendem que Washington quis reunir alianças no Sudeste Asiático e restringir assim a influência do “dragão adormecido” chinês.
Uma sondagem conduzida na China e no Japão, divulgada quarta-feira, dava conta de que mais de metade dos inquiridos chineses, 53 por cento, antecipam um conflito militar com o Japão “dentro de poucos anos”, cenário visto como provável por apenas 29 por cento dos japoneses.
O estudo de opinião, realizado pelo nono ano consecutivo, foi conduzido por uma organização não-governamental japonesa e pelo jornal oficial China Daily nos meses de Julho e Agosto. Obteve mil respostas do lado japonês e 1539 do lado chinês.
Segundo os dados divulgados, a impressão desfavorável dos japoneses relativamente aos chineses agravou-se de 90,1 por cento para 93 por cento, o nível mais elevado desde 2005, ano em que foi iniciado o inquérito. Em sentido contrário, a impressão desfavorável dos chineses relativamente aos japoneses sofreu melhorias, descendo de 92,8 por cento para 86,8 por cento.
Da parte japonesa, as opiniões negativas são justificadas com o entendimento de que “as acções da China são incompatíveis com o direito internacional”, “a China age de forma egoísta na procura por recursos, energia e alimentos” e ainda pela “posição crítica face ao Japão por motivos históricos”.
A tensão entre Tóquio e Pequim tem escalado continuamente, especialmente após o Japão ter assumido a soberania das ilhas Diaoyu/Senkaku, em 2012, no decorrer de uma longa disputa territorial no Mar da China Oriental.
Legitimar a governação
A iniciativa de instituir as comemorações de 2 de Setembro, celebradas também em Macau e Hong Kong, destina-se a “manter em mente a história com firmeza” e a “comemorar os mártires heróicos da guerra”. George Wei, director do departamento de História da Universidade de Macau, e Lau Sin Ping, educadora e antiga vice-presidente da Comissão das Celebrações do Regresso de Macau à Pátria, aplaudem a decisão, que admite ter sido impulsionada pela situação internacional.
“Recorda aos Estados Unidos e ao seu povo que a China e os norte-americanos eram aliados, sendo o Japão o seu inimigo comum”, entende Wei, académico que tem como campos de estudo a história chinesa e asiáticas, bem como a história das relações externas norte-americanas. “Diz também a outros países da Ásia Oriental, como o Vietname e a Coreia do Sul, que não devem esquecer a história”, entende.
Lau Sin Ping, da Associação de Educadores Chineses de Macau, defende por seu turno que, além da mensagem que tem como alvo os actores internacionais, o recado procura como destinatários específicos os jovens das regiões administrativas especiais.
Nascida em 1934, Lau recorda como a população de Macau “entusiasmo” no apoio à China Continental, um momento que a investigadora considera “glorioso” na história de Macau. Na última obra que publica sobre o conflito sino-japonês, vários capítulos são dedicado pela autora na defesa da ideia de que houve uma união étnica contra o adversário.
“Havia apenas cerca de 180 mil pessoas em Macau nesse período, mas recebemos um grande número de refugiados [do Continente], cuidámos deles e apoiámo-los. (...) E houve jovens apaixonados que se juntaram ao combate na mãe-pátria, acabando por ser aterrorizados. As pessoas locais foram sempre dando donativos até ao fim do combate. Mesmo as prostitutas da Rua Felicidade, estávamos todos juntos no apoio ao país”, afirma Lau.
Naturalmente, ambos os académicos admitem que a instituição desta memoria nacional promove o patriotismo e a consciência identitária nacional. Para George Wei, é também uma mensagem para a juventude, em especial para aquela “cuja concepção de patriotismo não é sinónimo de lealdade ao Partido Comunista”.
“Pretende-se sublinhar a legitimidade do Partido Comunista. A corrupção teve certamente um impacto negativo na governação, mas reiterar que se salvou as pessoas das mãos dos ‘jap’ [termo com conotação negativa] faz a diferença”, entende Wei.
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