domingo, 24 de novembro de 2013

CIGANOS (IV)



Queria, à viva força, vender um dos perfumes que, escondido, trazia num dos bolsos do casaco, mas não conseguia. O potencial cliente rejeitava um e logo o cigano tirava doutro bolso novo frasco, não se sabe se com o mesmo perfume ... E era ali, naquela estranha clandestinidade, que a não-compra começava ...

Entretanto, à saida do Metro, tudo muda de figura: de vez em quando, modesto no trajar,  pára um potencial cliente para ver o artigo que a cigana, sob o olhar atento do marido, estrategicamente posicionado, tem para vender ... Não muito longe de outra cigana, e de outra e de mais outra ... Todas a vender "o mesmo", cada uma de cores diferentes ... Pouca gente a comprar. A dúvida maior do que o preço ... Dúvida acerca da qualidade e da proveniência. Dúvida no preço e na transacção ... Medo de negociar "sem testemunhas", sem polícia perto ... DÚVIDA acerca da clandestinidade do acto ... Percebe-se haver gente interessada, mas logo adiante uma discussão entre ciganos, afasta potenciais compradores/as.

E fica-se a perceber melhor a feira, uma feira organizada onde ninguém se afasta, como que confiante no envolvimento ... Onde a integração pública está assumida pelas autoridades, o Zé compra, o cigano dos perfumes não está presente, mas o que vende casacos e sapatos, está - e faz negócio. Não só com gente das aldeias vizinhas, mas com os passantes (outros) que param porque, quase sempre, lhes falam em preços convidativos e discutíveis sem potenciais rixas.

Que caminho falta percorrer para a urbana loja cigana com perfumes, ou tecidos, ou sapatos, ou com o que quer que seja para vender a retalho? Talvez ... talvez séculos ... Então, o que está em curso poder-se-á chamar integração?

A exposição que o Museu da Cidade de Lisboa levou a cabo, até um destes dias, não sei quantos visitantes registou, mas foi um passo ... Um pequeno passo. Visitei-a duas vezes. Contudo, ainda não me apetece comprar perfumes na rua ... Mas, em contrapartida,  tenho em casa não sei o quê comprado em tenda cigana numa feira da Beira Interior. E não faço segredo disso. Nem eu, nem quem mo vendeu, estou certo,

Talvez esteja aí para bisnetos a loja, em centro comercial, por exemplo, declarada e claramente cigana. Com o inequívoco prestígio das melhores - mas a preços "de combate" e qualidade garantida. Assim seja, como talvez dissesse, HOJE, Francisco.

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