sábado, 27 de novembro de 2010

"A Arte de Escrever", na opinião de André Maurois

"São oito horas da noite. Hoje houve cheia na rua onde moro. Não consegui vir cedo para casa. Cedo, quer dizer, mais cedo, pois, habitualmente, à tarde, depois de sair do emprego e almoçar aí num restaurante qualquer, costumo dar uma volta pela "baixa" saboreando não sei bem o quê, mas, no entanto, procurando dar ao espírito novos ares que não os daquelas quatro paredes, meio cinzentas, meio de vidro,  do "atelier".

(...) Apetecia-me escrever, dizer ao papel "tudo", confessar-me. Não, não! o dia correu-me bem, não houve assim nada de especial. Simplesmente, apetecia-me escrever. Não sei bem o quê. (...) Sei que estou frente a um papel com lápis em punho a fazer desenhos que os antigos modernizaram e chamaram escrita.

Nesta escrita não tenho (...)"

É aqui que vem em meu auxílio um artigo de André Maurois, da Academia Francesa, que, curiosamente, fui encontrar no mesmo maço de "papéis velhos" onde, manuscrito a lápis, se encontrava o, acima, esboceto de qualquer coisa...

Vale, no entanto, pouco o esboceto, mas importa, no essencial, para dizer aos hesitantes da prosa, se os há, que "tudo vai no começar..."

Importante é, isso sim, ler Maurois (cala-te, Marcial, que, nem quando te chamaram poeta, o outro, claro, foste brilhante, digo eu...Embora haja teses a teu respeito...).

Em caixa alta, pois...

André Maurois:

"TEM A INTENÇÃO DE APRENDER A ESCREVER BEM? DOU-LHE RAZÃO. ACHO NATURAL. DE NADA SERVE TER IDEIAS JUSTAS SE NÃO SABE EXPRIMI-LAS. A PALAVRA, MESMO A PRÓPRIA ELOQUÊNCIA, NÃO BASTAM, PORQUE AS PALAVRAS VOAM. UM TEXTO FICA; AQUELES A QUEM ELE SE DIRIGE PODEM RELÊ-LO E MEDITÁ-LO. (...) PARA ESCREVER BEM É PRECISO TER CULTURA. NÃO É NECESSÁRIO ESTAR AO CORRENTE DA LITERATURA MAIS MODERNA. É PREFERÍVEL O CONHECIMENTO DOS GRANDES CLÁSSICOS, QUE FORNECEM EXEMPLOS E CITAÇÕES. (...) NÃO SE ESCREVE COM SENTIMENTOS, ESCREVE-SE COM PALAVRAS. PRECISAIS DE CONHECER MUITAS E DE SABER O SEU SENTIDO EXACTO. SE ASSIM NÃO FOR, EMPREGÁ-LAS-EIS A TORTO E A DIREITO, E O LEITOR NÃO VOS COMPREENDERÁ. A ACADEMIA FRANCESA CONSAGRA UMA SESSÃO A DEFINIR TRÊS OU QUATRO PALAVRAS.

(...) DEVEM-SE TER AUDÁCIAS DE LINGUAGEM E DE ESTILO? PODE-SE, DE LONGE EM LONGE, DESPERTAR UMA FRASE POR UMA EXPRESSÃO VULGARÍSSIMA? RESPONDERIA AFIRMATIVAMENTE SE A PESSOA EM QUESTÃO FOSSE DOTADA, AO MESMO TEMPO, DA AUTORIDADE E DO BOM GOSTO NECESSÁRIOS (...)."

E é tudo. Vou ver se sou capaz de continuar o "São oito horas da noite...", que me parece bem... Modéstia à parte. Até breve. Mais cedo do que as oito da noite...se possível...

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