Gostaria que nos transmitisse a emoção que tem tem sido estar a trabalhar há três meses nos preparativos que hão-de conduzir ao início do funcionamento do aeroporto de Macau...
É gratificante trabalhar numa empresa que está a começar, é gratificante pôr em funcionamento as suas operações, aproveitando realmente a experiência de 26 anos de trabalho numa companhia de aviação e tendo todo este trabalho, que irá reflectir-se no dia 9 de de Dezembro de 1995, com o início da operação regular da AIR MACAU.
Deve ser uma experiência não muito normal para um oficial de operações, começar com uma companhia nova, num aeroporto novo, num território em que, neste domínio, os antecedentes são zero.
Além de começar a companhia, começa também a operação do aeroporto.
É para mim, como oficial de operações de voo, gratificante poder encerrar a carreira em Macau, com montagem das operações, neste caso, da AIR MACAU, e acompanhar, além disso, a inauguração de um aeroporto num território ainda de bandeira portuguesa.
O que é, em linhas gerais, um oficial de operações de voo? Que importância tem na equipa que acautela a segurança das pessoas e põe o avião "a mexer"?
Só para dar uma ideia: o curso de oficial de operações de voo, numa companhia de aviação, é aquele que aproxima mais as pessoas do avião. Além dos pilotos, claro.
O piloto será o elemento máximo, a seguir vêm o oficial de operações de voo e os homens da manutenção.
São, em terra, os oficiais de operações de voo que preparam todo voo, no sentido de o comandante, quando chegar para sair, ter todas as condições previstas e todo o planeamento feito.
Ele dará o seu acordo, ou não, e se não der, há que conversar e fazer novo planeamento. De qualquer maneira, é o elemento que prepara todo o voo para o entregar ao comandante.
O comandante aceita, ou não aceita. Normalmente, aceita. O planeamento é elaborado a partir de normas rígidas e, uma vez aceite, constitui a base do voo.
Estamos aqui, como no futebol, o quarto árbitro?... Fora de campo, mas dentro...
Está fora do avião, mas o seu trabalho é utilizado pela tripulação em voo.
É uma espécie de "tripulação em terra"?
Não diria isso. Diria antes que é, em terra, o que zela por uma boa condição de voo, que zela pela segurança que diz, em termos de cálculos, qual o combustível necessário (não pode haver erros), dá as condições que planeou, dá as indicações quanto ao aeroporto alternativo (neste aspecto, todos os voos comerciais, por norma, por uma questão de segurança, têm sempre um aeroporto alternativo, independentemente das condições de tempo e outras). Há que saber qual é o aeroporto que, no caso de não poder aterrar no aeroporto de destino, qual é o aeroporto "substituto" e qual o combustível calculado para essa situação.Escolhido em função do dia e das condições de cada um.
Quais são os mais prováveis para a região de Macau?
Em Macau, do lado da China, temos três aeroportos: Guangzhou, Xangai e Zhuhai.
Hong-Kong é um aeroporto com muito tráfego e está de tal maneira perto que só pode ser utilizado, não em termos de planeamento, mas em termos de emergência.
Estamos, portanto, no caso, numa situação de pioneirismo: o aeroporto não existia, no território nunca ouvi falar dele, a não ser, há uns dez anos, a Stanley Ho. Era, contudo, uma proposta que tinha a ver com aterros e, portanto, complicada. O que é que sente?
Em relação ao aeroporto e às condições que me trouxeram para aqui, a coisa passou-se assim: "vais para Macau, vais montar um serviço de operações. É uma companhia que vai começar, é uma companhia que tem pessoas de várias origens, principalmente, portugueses e chineses. Vai ter um aeroporto que tem condições "sui generis" em aviação. Um aeroporto que é construído sobre a água, com uma pista com aeroporto desviado".
Quando chego a Macau, das primeiras coisas que tive mais curiosidade de ver foi realmente o aeroporto. Não é um aeroporto normal, e depois foi a circunstância de vir trabalhar com pessoas de culturas diferentes, como é o caso do pessoal chinês, com mentalidades completamente diferentes.
Embora tenha uma coisa a nosso favor, que é a tecnologia que nós fomos buscar aos nossos serviços na Europa. Transportámos todo este "know-how" para Macau e transmitimo-lo às pessoas que trabalham connosco. Provavelmente, essas pessoas serão, no meu caso, amanhã, oficiais de operações em Macau.
São pessoas residentes e nascidas em Macau . Algumas chinesas. Mas estou convencido de que é uma experiência ímpar, em termos de aviação. Inaugurar, ou montar, o serviço de operações numa companhia aérea e vir assistir à inauguração de um aeroporto é, de facto, uma oportunidade única.
E num território que vai deixar de ser administrado por quem agora põe toda a "máquina" a funcionar...
Com todas essas "nuances" que não acontecem mais...
Com é que os de cá reagem ao facto de terem agora um aeroporto? Como é que sente a sua adaptação à nova realidade?
Os asiáticos residentes em Macau, principalmente, revelam desconhecimento dos assuntos aeronáuticos, o que é natural, uma vez que não existia no território nada parecido com aviões e nada semelhante a um aeroporto. São pessoas que estão, neste momento, numa fase de aprendizagem, embora muitas delas tenham cursos sobre dados teóricos acerca da aviação, acerca de operações no aeroporto e sobre todas essas situações. São pessoas que ainda mantêm uma certa linha, que é preciso que esteja escrita. Se está escrito, seguem o que lêem. Quando se foge daquela linha, há um compasso de espera: "se está escrito assim, o que é que eu faço agora?..." É uma fase que obriga a uma ginástica considerável. Terão que ir ganhando à vontade, a pouco e pouco...
Que movimento de aviões está previsto inicialmente?
No aeroporto haverá, para já, segundo sei, quatro ou cinco companhias que irão começar a operação no dia 9 de Novembro (1995). O aeroporto será inaugurado no dia 8 de Dezembro.
A AIR MACAU terá, em princípio, no dia 9 de Novembro, dois voos - para Pequim e Xangai. São dados que talvez venham a fazer história...
E por isso o entrevistador as registou. Para, inéditas, a transmitir logo que possível...
Próximo, e último, entrevistado da série "Subsídios para a História - Macau 95": Padre Lancelote, Lancelote Miguel Rodrigues.
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