sábado, 11 de julho de 2015

Cartas à minha neta *

* Que não precisou de as ler todas para agora ser o que conseguiu ser, é verdade! O livro, que o conjunto de cartas "justificava", ficou nas mãos do Carlos Pinto Coelho que, dias antes de falecer, teve a amabilidade de se interessar pela sua, parcial ou total, publicação. Infelizmente, para ele e para todos nós, isso não foi possível - e o "manuscrito", enquanto tal, é hoje uma peça de arquivo (pessoal).Sem pretensões. Mas agora que a principal destinatária, fez e pratica o essencial do que aprendeu por onde passou, não resisto à divulgação (repetida? Este blogue, por exemplo, já tem mais de 7000 mensagens ...) da primeira dessas cartas de boas intenções. E lá vai ... Porque pode, eventualmente, ser "introdução" para diálogos - aí em casa ...

"A fazer fé em informações registadas nas memórias que a saudade 

aviva e em assentos que hão-de saciar ratos, nasci às 8 e 38 da noite, 

fez ontem, 68 anos, numa quarta-feira. Tu mo lembraste bem cedo, 

estava eu, tomados os comprimidos da manhã, a pensar escrever-te… 

Com regularidade, assim como quem sente necessidade de falar ao (teu) 

futuro. É, para já, coisa íntima, mas a que, pelo meu lado, nada oponho a 

que o não seja, uma vez que, entre nós, não há segredos e esses, se os 

houvesse, seriam, como diria Torga, revelados em cifra, que, note-se, 

não é forma de se exprimirem gerações quando muito se querem – às 

claras. Como é o caso.


De que me vais falar avô?”, perguntar-me-ás. Não sei… Ou melhor: sei. 

Vou falar-te de tudo o que, eventualmente, possa, a meu ver, ser útil, ou 

interessante, ou esclarecedor, ou belo, ou risonho, ou arma contra o 

medo e a solidão, neste mundo cheio de gente, cheio de contradições e 

transbordante de desafios, isto é, de apelos à juventude que, em ti, 

acredito ser muito mais do que ferverosa dançarina de hip hop


Não te admires que diga coisas acerca do que, nas sete partidas do 

mundo, tenho arquivado – e venham a propósito; nem te surpreendas 

que, do meu dia-a-dia, te faça, uma vez por outra, o retrato mais ou 

menos impressionista. Estou a pensar também referir-te, aqui ou acolá, 

reflexões acerca das leituras em que, agora, mais do que no passado por 

conta de outros, mergulho com frequência, qual desafio a mim próprio, 

em abordagens repetidas e separadas, de vez em quando, vários anos 

(como me diverte este diálogo entre eu e eu, afastado Primaveras a 

fio…). Talvez não resista também a uma selectiva ( e apropriada, espero) 

transcrição (fresca…) de crónicas, saídas na imprensa, em secções 

próprias, antes do “olá, mãe!” ou quando tu e eu comunicávamos pelo 

calor das mãos e através daquelas nossas gostosas conversas 

inspiradas na tua agenda feita de cantigas e de tantas, tantas coisas 

bonitas.




Vai ser assim. Ou não vai ser assim. Vai ser como a cabeça me ajudar e 

o futuro (que para mim, és tu) continuar a querer, sendo certo que, como 

notou Vergílio Ferreira, “escrever bem não é escrever bem mas sentir 

bem.”  

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