Vozes amigas têm-me feito chegar curiosidade e grande (e amável) interesse pelas "Cartas", que enviei "à Minha Neta" e que agora passaram a ser, definitivamente, por decisão que me alegra, mas me ultrapassa, "Cartas do Meu Avô".
Enquanto se aguardam novas de eventuais editoras (estas coisas, quando não metem escândalos, pornografia, ou outras chagas sociais ... não são fáceis...), aí fica a primeira, das, mais ou menos, duzentas e cinquenta achegas escritas por um avô nascido no século passado e...e vivo nesta primeira metade do século XXI.
Reza assim:
"SAC, 18 de Novembro de 2005
Querida Mónica
A fazer fé em informações registadas nas memórias que a saudade aviva e em assentos que hão-de saciar ratos, nasci às 8 e 38 da noite, fez ontem 68 anos, numa quarta-feira .
Tu mo lembraste bem cedo, estava eu, tomados os comprimidos da manhã, a pensar escrever-te... Com regularidade, assim como quem sente necessidade de falar ao (teu) futuro. É, para já, coisa íntima, mas a que, pelo meu lado, nada oponho a que o não seja, uma vez que, entre nós, não há segredos e esses, se os houvesse, seriam, como diria Torga, revelados em cifra, que, note-se, não é forma de se exprimirem gerações quando muito se querem - às claras. Como é o caso.
"De que me vais falar, avô?" perguntar-me-ás. Não sei... Ou melhor, sei. Vou falar-te de tudo o que, eventualmente, possa, a meu ver, ser útil, ou interessante, ou esclarecedor, ou belo, ou risonho, ou arma contra o medo e a solidão, neste mundo cheio de gente, cheio de contradições e transbordante de desafios, isto é, de apelos à juventude que, em ti, acredito ser muito mais do que apenas ferverosa dançarina de hip hop...
Não te admires que diga coisas acerca do que, das sete partidas do mundo, tenho arquivado - e venham a propósito; nem te surpreendas que, do meu dia-a-dia, de faça, uma vez por outra, um retrato mais ou menos impressionista.
Estou a pensar também referir-te, aqui ou acolá, reflexões acerca das leituras em que agora, mais do que no passado por conta de outros, mergulho com frequência, qual desafio a mim próprio, em abordagens repetidas e separadas, de vez em quando, vários anos (como me diverte este diálogo entre eu e eu, afastado Primaveras a fio...). Talvez não resista também a uma selectiva (e apropriada, espero) transcrição (fresca...) de crónicas, saídas na imprensa, em secções próprias, antes do "olá, mãe!" ou quando tu e eu comunicávamos pelo calor das mãos e através daquelas nossas gostosas conversas inspiradas na tua agenda feita de cantigas e de tantas, tantas coisas bonitas.
Vai ser assim. Ou não vai ser assim. Vai ser como a cabeça me ajudar e o futuro (que, para mim, és tu) continuar a querer, sendo certo que, como notou Vergílio Ferreira, "escrever bem não é escrever bem, mas sentir bem".
Enquanto se aguardam novas de eventuais editoras (estas coisas, quando não metem escândalos, pornografia, ou outras chagas sociais ... não são fáceis...), aí fica a primeira, das, mais ou menos, duzentas e cinquenta achegas escritas por um avô nascido no século passado e...e vivo nesta primeira metade do século XXI.
Reza assim:
"SAC, 18 de Novembro de 2005
Querida Mónica
A fazer fé em informações registadas nas memórias que a saudade aviva e em assentos que hão-de saciar ratos, nasci às 8 e 38 da noite, fez ontem 68 anos, numa quarta-feira .
Tu mo lembraste bem cedo, estava eu, tomados os comprimidos da manhã, a pensar escrever-te... Com regularidade, assim como quem sente necessidade de falar ao (teu) futuro. É, para já, coisa íntima, mas a que, pelo meu lado, nada oponho a que o não seja, uma vez que, entre nós, não há segredos e esses, se os houvesse, seriam, como diria Torga, revelados em cifra, que, note-se, não é forma de se exprimirem gerações quando muito se querem - às claras. Como é o caso.
"De que me vais falar, avô?" perguntar-me-ás. Não sei... Ou melhor, sei. Vou falar-te de tudo o que, eventualmente, possa, a meu ver, ser útil, ou interessante, ou esclarecedor, ou belo, ou risonho, ou arma contra o medo e a solidão, neste mundo cheio de gente, cheio de contradições e transbordante de desafios, isto é, de apelos à juventude que, em ti, acredito ser muito mais do que apenas ferverosa dançarina de hip hop...
Não te admires que diga coisas acerca do que, das sete partidas do mundo, tenho arquivado - e venham a propósito; nem te surpreendas que, do meu dia-a-dia, de faça, uma vez por outra, um retrato mais ou menos impressionista.
Estou a pensar também referir-te, aqui ou acolá, reflexões acerca das leituras em que agora, mais do que no passado por conta de outros, mergulho com frequência, qual desafio a mim próprio, em abordagens repetidas e separadas, de vez em quando, vários anos (como me diverte este diálogo entre eu e eu, afastado Primaveras a fio...). Talvez não resista também a uma selectiva (e apropriada, espero) transcrição (fresca...) de crónicas, saídas na imprensa, em secções próprias, antes do "olá, mãe!" ou quando tu e eu comunicávamos pelo calor das mãos e através daquelas nossas gostosas conversas inspiradas na tua agenda feita de cantigas e de tantas, tantas coisas bonitas.
Vai ser assim. Ou não vai ser assim. Vai ser como a cabeça me ajudar e o futuro (que, para mim, és tu) continuar a querer, sendo certo que, como notou Vergílio Ferreira, "escrever bem não é escrever bem, mas sentir bem".
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