sábado, 10 de dezembro de 2011

Mensagem de Agostinho da Silva *

* in Nova Renascença - Outubro de 1980

"Vejo a primeira "Renascença" - e a sua Faculdade de Letras - como tendo procurado um centro a Portugal e o encontrado num "indefinível vivido", aquele a que José Marinho, em alargamento total, chamou "insubstancial substante".

Olho a segunda - e a sua Faculdade - como desejando definir o que é periferia portuguesa, nesse outro indistinto em que constrói Portugal, com chineses, malaios e japoneses, com muçulmanos e judeus, com africanos e ameríndios, e até com europeus, aquela concreta tessitura de "vida conversável", sempre renovada e aberta, de que falou, num momento supremo de cultura, o Pero Lopes em cartas do Brasil.

Gosto de imaginar uma terceira - e lhe seja Faculdade o Mundo - em que a periferia e centro se confundam, em que a lembrança e projecto numa só estátua, e animada, formem, em que o Deus que adoremos seja o Todo e o Nada, sempre, sempre em nós, de nós, a nós, por nós, voltando, num perpétuo e momentâneo e parado mover-se na imanência e transcendência, como em simultâneos sístole e diástole: só então Portugal, por já não ser, será."

"Periferia e centro se confundem"
"Abstracto e concreto uma só estátua"
"Deus (...) seja o Tudo e o Nada"
"Simultâneas sístole e diástole"

querido Prof. Agostinho da Silva, venha dizer-nos em que fase estamos, nós que  "sabemos que o sonho comanda a vida..."

Que gente é esta que nos atormenta? Que gente esta que, aqui, abusou da boa-fé colectiva?


Nós sabemos que é nossa parte importante da história do mundo; nós sabemos, claro, mas os outros sabem também e querem-nos prostituir ... Em nome de quê, Professor? Lá onde está conhece o caso da Grécia, que tanto mundo deu ... Que será um dia feito dela? Alguém se lembrará do povo que foi, ou olhar-se-á apenas o que ainda é visível?

Sagres é, para Portugal, eu sei, um lugar carregado de história, mas, para nossa mágoa, ou não, quem a vir tem de acreditar sem ver... Sagres, finalmente, Professor, é o Portugal do futuro, é o acreditar sem ver? É o Portugal que, confundindo, misturado com os outros, "por já não ser", é?

O senhor, que viu os outros morrer, mas continua, diga-nos agora, ou encarregue alguém dessa palavra de estímulo, dessa penincilina milagrosa que nos possa salvar. Há por aqui, não só em Portugal, mas para lá do que a geografia diz, tanto interesse oculto, tanta "face oculta", que, às vezes, até parece que não fomos - nem somos ... Apesar de, aqui para nós, apetecer acreditar que da "estátua" a que se refere, ainda nos restam, pelo menos, os pés ... Que nos pisam, talvez por os verem descalços ... Digo eu.

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