domingo, 26 de fevereiro de 2012

A cidade e as serras

















A cidade e as serras, as terras ... Isso era dantes. Hoje a televisão, a Internet, a Comunicação Social instantânea leva a guerra ao mais recôndito lugar do mundo e a gente vai da cidade convencido de que consegue ignorar a maldade, a vigarice, a guerra, o proscénio e ... e, de repente, lá está tudo ao virar da esquina, no minimercado que foi tenda, no forno comunitário que é padaria, no talho que foi açougue, no café que foi taberna.

E, por novos caminhos, quase não há quem não seja conduzido aos pecados dos grandes espaços: basta para isso que não seja cego e surdo.

É claro que há a Escola. Escola que ensina. Mas irrompeu uma diferença: agora tem que ensinar uma matéria nova, mais relevante do que qualquer das outras aprendidas no passado, como as letras, os números, as terras e uma ou outra invenção feita às vezes longe e comunicada, sabe Deus como, por quilómetros e quilómetros de fios esticados a partir ignora-se donde ... Hoje, abrem-se os olhos, fecham-se os olhos, carrega-se num botão ou escreve-se uma "palavra mágica" e aí temos o mundo, tal qual é, a não consentir tendas, açougues, tabernas, fornos comunitários.

"Ah, mas a comunicação humana contemporânea tirou do isolamento milhões e milhões de pessoas ..." Dir-se-á. É verdade! Mas tirou-nos uma certa simplicidade das coisas ... E é isso que noto, sem grande razão de queixa, apesar de tudo: não ando com o portátil às costas, por exemplo. O portátil dos "abraços de plástico", das amizades sintéticas, da ilusão permanente de que estamos em todo o lado, ainda que a fingir ...

É verdade que passámos a ter bibliotecas que dir-se-iam inacessíveis; é verdade que nos foi franqueada a entrada fácil em palácios e lugares de visita quase impossível ... É. É assim. Mas pagamos por isso o alto preço da quase queda da privacidade. Já não há aldeias, há lugares que foram aldeias ou mesmo vilas. Não tarde aí o desaparecimento do conceito de cidade. A Terra qualquer dia não passa de um sítio dos arredores da Lua, onde talvez, numa primeira fase, passe a haver tendas, fornos comunitários, açogues, tabernas - com a diferença, a novidade do electrónico a impor-se como se, no planeta Terra, estivessemos há mais de 1000 anos a vermo-nos ao espelho das águas límpidas de um rio ...

Acho piada, acho até mesmo comoventes, as lutas intestinas que, em tempos de maternidade electrónica, se congeminam a favor da existência de certas divisões administrativas nos pedaços de espaço cibernético em que nos dividimos ... Tem piada até porque, pelos modos, quer dizer que as chamadas redes sociais, assim, não passam de meras tribunas de vaidades sem camisa, sem qualquer mérito na chamada comunicação humana, saudosa dos tempos da velha tasca e do forno comunitário, enquanto pontos de encontro e tribunas políticas. Mas é assim que vivemos. Na cidade e nas serras, nas terras.

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