sexta-feira, 20 de abril de 2012
Canteiro de palavras (XLVII) - Cervantes
"- Ditosos tempos e afortunados séculos esses, a que os antigos deram o nome de idade de oiro, nanja porque o oiro, que na nossa idade de ferro tanto se adora, então se alcançasse sem nenhuma espécie de fadiga, mas porque se ignoravam as palavras teu e meu. Eram comuns todas as coisas naquela era feliz. A ninguém, para obter o sustento quotidiano, era necessário mais esforço do que erguer as mãos e tirá-lo das robustas azinheiras, que liberalmente estavam convidando os humanos com seu doce e sazonado fruto. As claras fontes e cursos de água ofereciam a quem tinha sede a linfa cristalina e saborosa. Nas taladas dos rochedos e no côncavo das árvores montavam suas repúblicas as solícitas e discretas abelhas, oferecendo grátis a quem queria a fértil colheita dos dulcíssimos favos.
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A justiça mantinha-se nos limites próprios, sem que ousassem perturbá-la ou feri-la o favor e o interesse que hoje tanto a conspurcam e viciam. A lei do arbítrio ainda não tinha avassalado o entendimento dos juízes, e por esta razão é que não havia pleitos que julgar nem réus que devessem ser julgados."
in D. Quixote de La Mancha, de Miguel Cervantes
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