MACAU - "É difícil realizar sonhos?"

Dom Quixote entre o sonho e a realidade  by Ponto Final

A produção local “Back to the World of Don Quixote” reflecte sobre a perseguição dos sonhos numa era dos impetuosos.

Iris Lei

Como lidar com os arrependimentos da vida numa era de ímpeto livre é o mote da última peça da Associação Teatral Hiu Kok, um dos mais estabelecidos grupos dramáticos locais, para reflexão pelo público. O espectáculo pode ser visto sábado, a partir das 18h, no Centro Cultural de Macau.

“No passado nunca fomos ricos, mas atreveríamo-nos a arriscar porque nada tínhamos a perder. Agora somos ricos, mas as pessoas são menos impetuosas porque têm receio de perder o que têm”, diz-nos Billy Hui, encenador de “Back to the World of Don Quixote”, que vai à cena em cantonês.

O director dramático, activo na cena teatral desde 1986, entende que a juventude local tem hoje mais restrições à perseguição dos seus sonhos. Tal, diz, surge como peculiar, já que a taxa de desemprego está num mínimo histórico e a economia continua a crescer muito favoravelmente.

“Há muitas coisas que as pessoas esperam alcançar durante o seu tempo de vida, mas por vezes acabam por adiá-las para manter um estilo de vida”, reflecte. “Se nos for dada mais uma oportunidade, sem sucesso garantido, atrevemo-nos a arriscar?”, questiona.

A peça da Hiu Kok viaja através dos anos 1980 até à actualidade e anda em torno de um grupo de antigos alunos que ganha coragem de levar uma peça inacabada à cena passados 20 anos. A família e os compromissos profissionais são as dificuldades a ultrapassar. “Quando toda a gente tem famílias, torna-se muito difícil realizar estes sonhos”, diz Hui.

A produção da peça não pretende dar resposta à questão sobre o que fazer com o arrependimento sobre as oportunidades perdidas, mas tem a ambição de apontar às novas gerações o tema da realização dos sonhos, quer os protagonistas da peça seja ou não bem sucedidos nos seus intentos.

Mas porquê escolher para personagem central do drama D. Quixote, Cavaleiro da Triste Figura nas traduções de Cervantes em Portugal, mas por outros apelidado de Cavaleiro dos Sonhos, “ingenioso” no seu original?

“Dom Quixote é um louco que persegue os moinhos de vento? Ou é um cavaleiro que nunca se compromete com a realidade? Ou, actualmente, é um mero nome de restaurante, marca de vinho ou de chocolate?”, é-nos retorquido na apresentação da peça.