domingo, 10 de novembro de 2013

Aeroportos - entre a balbúrdia e a devassa


De tantas chegadas e partidas, às vezes, dou comigo, na solidão do mundo e do quotidiano filho da puta em que se vive, a pensar quantas vezes, nos aeroportos, que não o da Portela, em Lisboa,  fui recebido apenas pelo reboliço, pela pressa cega da multidão nos diferentes países onde aterrei... E chego à conclusão que foi o natural anonimato da maioria que, hoje, me sublima o abraço que, por vezes, poucas, me esperou.




Recordo Kinshasa, no Zaire, onde, de repente, alguém, igual na cor da pele, no meio da generalizada negritude, em português igual ao meu, me pergunta se sou o ... E, confirmada a identidade, pede-me, quase sem respirar, a documentação toda e me sugere que "tranque" entre as pernas a bagagem desembarcada, enquanto vai tratar da formalização do que havia a formalizar no meio daquele salsifré quase monocolor dos rostos. Estava ali, soube depois, da parte da embaixada de Portugal e do meu posterior amigo Jaime Viana ( de saudosa memória)  e o objectivo era livrar-me da confusão dos dialetos e da miséria, no caso, antecipadamente, conhecida e misturada com a eventual chantagem dos valores a cobrar por tudo ... Juntos, minutos depois, táxi apanhado quase em corrida, vidros fechados hermeticamente com inúmeras mãos cá fora coladas ao carro, tinham passado já largas dezenas de metros quando, finalmente, a caminho de Kinshasa-cidade foram possíveis cumprimentos e explicações ...


Recordo o aeroporto de Sydney, onde a distância percorrida a partir de Portugal, torna particularmente feliz o momento do encontro com alguém que nos espera em Português.

Recordo Moscovo (ex-URSS) e a sensação de, no aeroporto, ser, não confrontado, mas devassado ao exibir o passaporte às autoridades locais.

Recordo a primeira vez em que, sozinho, estive em Macau e vivi "a tragédia" do desembarque em português a uma terra onde, para chegar, era (é) preciso recorrer ao jet-foil a partir de Hong-Kong, no caso, na altura, sem conhecer ninguém ...

Recordo a minha chegada ao aeroporto de Goa e o que de boas vindas representou ouvir o meu nome nos altifalantes locais ...

Recordo a chegada, não a um aeroporto, mas ao Cais da Rocha, em Lisboa, e à família, após um mês de ausência física ...

Recordo a chegada ao aeroporto da Portela, em Lisboa,  e os abraços que me esperavam após três meses de emoções e sobressaltos numa Volta ao Mundo.

Recordo-me de mim, chegado pela mão da minha neta, não há muitos anos, a este "aeroporto" da NET e da ruadojardim, onde todos os dias desembarco, no aeroporto do não-estar, que a vida em terra é filha da puta e traiçoeira ... Velhaca mesmo. E raras vezes nos recebe bem, e, muito menos, em sari - como naquele fim de tarde em Goa, da minha saudade.

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