quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Cartas, p´ra que vos quero?...


P´ra que vos quero? Quero!!! Quem me dera, agora, agora mesmo, para além da memória e dos objectos que a animam, ter aqui CARTAS, cartas, por exemplo, de meus pais ... De ... E de ... Mesmo dos que, não sabendo escrever, as "mandaram fazer" ... Mesmos desses. Talvez, sobretudo, desses.

"Ah, mas tens os objectos que te calharam em sorte ..." Sim, mas não é mesma coisa ...

Reveja-se Vergílio Ferreira:

"Escrever cartas. Está hoje fora de moda como tudo. Porque tudo é agora velocidade, ser-se por fora, usar e deitar ao lixo. Não se escrevem cartas - telefona-se. Não se usa o interior, usa-se a pele. Lê-se pouco o livro, basta a TV, que é um dom divino para o analfabetismo. O telefone dá despacho rápido ao que se comunicava por carta. E é mais caro, que é a vantagem de tudo o que tem preço alto, que é ter preço menos comunitário. A carta. Era o tempo de um viver sossegado, de se percorrer a intimidade de nós e de se estar aí bem. Havia a agitação do que nos agitasse, mas dizê-lo remansamente reconduzia ao sossego. Era do tempo de ter problemas para os desdobrar em escrita e de se ficar aí mais planificado. Era o tempo de se conversar e não de atropelar palavras no momentâneo aturdimento. Era o tempo de se ter alma e não o seu contraplacado. Era o tempo de se terem ideias e não bocados de cortiça. O tempo do silêncio e não dos gritos das massas. O tempo de se estar só e não dos encontrões de se estar em companhia. A carta. Memória antiquíssima a descobrir talvez um dia como os manuscritos do Mar Morto."

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