terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Geografia - Transplantação intercontinental 2












"(...) A esperança de uma cultura mais profunda no Canadá poderia estar nas gentes que o procuram se a sua própria condição não tivesse determinantes exclusivamente económicas. Assim o sabor final de Toronto, Montreal, do Canadá há-de ser aquilo que os "robots" quiserem, depois de misturados os ingredientes mais ou menos suaves, mais ou menos fortes, dos povos ali instalados, idos da Europa. Quer dizer que os computorizados E.U.A, que têm no seu vizinho do Canadá um compadre afeiçoado, hão-de dominar a seu jeito, mesmo que nada façam de propósito para isso. A atracção dos resultados obtidos a partir do dólar US, que está perto e é fascinante, influenciará o que a Europa de longe "quer" que seja o mundo de amanhã. E a emigração pouco poderá conseguir já que, por mais que se faça por ela, não tem resistências culturais suficientes para escapar à "maldição" dolariana. A esperança está nas reservas de índios ainda existentes, desde que não as metam em negócios e lhes proporcionem, quanto antes, um estágio na Europa - prolongado, com bem-estar - mas sem dólares.

O Canadá (e também os EUA), fez-me lembrar a formiga. E eu admiro a cigarra. Ou nem uma nem outra. Mas nunca a formiga sem nada de cigarra. Trabalhar nos intervalos da leitura, em vez ler nos intervalos do trabalho - como objectivo. O dólar como meio. Jamais como fim. Morrer a ouvir ópera, vendo Rafael, Miguel Ângelo, Ticiano, Velasquez. Evitando ser enterrado numa sala de computadores ou à beira dum cofre a contar notas.

Canadá-mescla. E sendo assim - esperança.

Canadá-alienação pelo dinheiro. E sendo assim - morte.

Canadá-EUA. E sendo assim abdicação. Mas, do mal o menos: betão, cálculo científico e, amanhã, não morte mas - Marte.

Canadá-juventude. E sendo assim - futuro. Mas só em Montreal, 136 escolas com capacidade para 300 crianças cada, fecharam nos últimos três a quatro anos por falta de alunos. Num dos maiores países do mundo. Por isso - que futuro? Dos velhos afogados em jogos de bolsa e sonhando com contas bancárias? Dos que trabalham sem viver e legam, como resultado natural do cifrão, uma geração que quer viver sem trabalhar? E surge a droga.Quem pode acusar quem?

Acode, então, como mezinha mais radical do que a preconizada vinda à Europa de uns ingénuos índios sem cêntimos, a generosa ideia de uma transplante intercontinental: o Velho Continente, com armas e bagagens, vivendo uns anos na zona do dólar, passando a gente do Canadá (e já agora dos EUA), por troca temporária, para as regiões aquém e além Pirinéus. Ou, em alternativa, uma torre de Toronto por uma Pigale; um Louvre por uma NASA; o templo de Diana, de Évora, por umas toneladas de trigo.

E que tudo assim seja feito -para saúde do universo e felicidade dos mortais."  1978

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