terça-feira, 10 de março de 2015

MACAU - O que os chineses dizem fora do Palácio





by Ponto Final
A qualidade das leis, os temas ambientais e as propostas económicas são os temas que mais chamam a atenção de quem vive em Pequim.
Lou Shuo, em Pequim
“Muitos funcionários do Governo já perderam fé na lei. Isso é um facto muito lamentável na China”, diz-nos ao pé da estação de metro Tuanjiehu um jovem com apelido Wang, que trabalha num escritório de advocacia em Pequim.
As reuniões da Assembleia Nacional Popular (APN) e da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CCPPC) estão em pleno andamento na capital chinesa. Fora dos sítios onde acontecem as reuniões, o PONTO FINAL procurou opiniões sobre o maior acontecimento político anual do país.
Wang mostra-se sobretudo interessado nas questões que envolvem legislação. “Presto atenção nos assuntos jurídicos durante as reuniões, devido à minha profissão. Especialmente, na área de protecção dos direitos dos cidadãos ainda está muito por fazer”, aponta.
O jovem advogado entende que “muitos funcionários do Governo apenas vêem a lei como uma ferramenta da Administração”, em vez de “valorizarem o ponto de vista do povo”. Wang dá o exemplo do processo da elaboração da lei dos transportes públicos. “Acredito que maioria dos funcionários do Governo não anda de autocarros nem metro. Como é que a lei promulgada representa a posição das pessoas?”, questiona.
Além disso, Wang também nota mudanças de tom nas reuniões deste ano. O advogado identifica “mais esforço e determinação no combate à corrupção, mais atenção à protecção ambiental e propostas mais qualificadas entregues pelos delegados”.
“Já sacrificámos tanto para ter uma economia desenvolvida na China. A má qualidade do ar é uma dor que todas as pessoas deste país conseguem sentir agora”, junta.
Para Liang Liang, empresário de Pequim, 50 anos, o relatório que o primeiro-ministro Li Keqiang apresentou na passada quinta-feira na abertura da APN “é o mais razoável e prático”, por comparação com os programas apresentados anteriormente pelo Governo Central. Nomeadamente, destaca as políticas e medidas para as áreas do desenvolvimento económico e do ambiente.
Debaixo da cúpula
Acerca da expectativa de crescimento da economia em cerca de sete por cento este ano, evidenciando a tendência de desaceleração, Liang compara o processo a “uma corrida por longa distância”. “Se for uma corrida com ritmo rápido demais, é difícil respirar. Ao mesmo tempo, se formos muito devagar, ficamos atrás dos outros”, ilustra.
No entanto, o empresário mostra-se preocupado com o impacto que a desaceleração económica da China pode trazer. “Pode causar uma situação caótica e acto de secessão dentro do nosso país, à semelhança de problemas acontecidos no conjunto dos países europeus”, problematiza.
No caso de um soldado reformado, cerca de 60 anos, as reuniões políticas não o atraem muito. Conta que tem pouco interesse em ver televisão e que a maior parte do seu tempo é dedicado a acompanhar o neto. Mas há um assunto que o preocupa: os produtos falsificados à venda no mercado chinês. “É um problema profundamente arraigado, que é a falta de integridade nacional”, sentencia.
O ex-soldado deixa elogios à reforma do sistema hukou, para registo de residência e ao qual estão anexas uma série de garantias sociais”. “É bom ver o Governo dar um passo para frente, embora não haja grandes progressos. Dá esperança àqueles que vêm aventurar-se em Pequim”, diz-nos.
Um outro funcionário de uma empresa de transporte marítimo em Pequim diz ao PONTO FINAL que a sua única impressão das reuniões decorre do facto de no mês passado ter com os seus colegas ajudado a redigir a proposta do seu chefe, um dos cerca de três mil deputados à APN. “A proposta é sobre a rota da seda marítima”, revela.
Entre as pessoas entrevistas pelo PONTO FINAL, há interesse na questão ambiental. Duas deixam elogios ao documentário “Under the Dome”, dirigido por uma jornalista chinesa, Chai Jing, que estreou na Internet pouco antes da abertura das reuniões e que tem sido amplamente debatido na sociedade.
O documentário, com duração de quase duas horas, baseia-se na investigação de Chai sobre a poluição atmosférica na China e já foi visto online mais de 31 milhões de vezes. Agora está impedido pela censura. “Faltam pessoas como Chai na China. A protecção ambiental é uma causa e missão para toda a gente”, diz o ex-soldado.
O empresário Liang Liang também “apoia totalmente” o documentário de Chai, e considera-o como um “grito” a chamar a atenção para o problema e “uma advertência aos líderes do país”.

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