Às vezes ...
ÀS VEZES vou dar uma volta pelo jardim e ponho-me a pensar no que é que adianta estar aqui, tanto quanto possível, todos os dias, sentado neste banco de parlamento, com mais ou menos gente, incapaz de estar calada ...
ÀS VEZES fico a pensar p'ra que serve o que aqui partilho com a "Humanidade" se, depois, chego a casa, abro, por exemplo, a televisão, e lá continuam os mesmos a dizer o mesmo, a falar de guerras entre seres que se dizem inteligentes ...
ÀS VEZES não venho p'ra aqui e recolho-me a ler, não os dicionários que me obrigam a escolhas (estão lá, em princípio, pelo menos, as palavras essenciais à comunicacão), e desisto ou venho p'ra aqui, para esta espécie de parlamento - a ler. Apenas a ler. A ler - e falar. Mas, sem querer, lá me volta a tragédia, enquanto motora de discursos, de livros, do melhor da maior parte que a literatura deu e continua a dar (jornais antigos/contemporâneos).
"O "führer" ordenou a solução final do problema judaico. Somos nós, da SS, que temos de executar os planos. É um trabalho difícil, mas, se não for realizado imediatamente, se não formos nós a exterminar os judeus, serão eles exterminar os alemães no futuro. (...)"
E exterminaram 2,5 milhões de pessoas.
"Foi um trabalho difícil, mas ..."
Dir-se-á que são momentos da história. MENTIRA! Os noticiários diários continuam cheios de palavras iguais - a única coisa que fizeram, que fazem, é, por vezes, embrulharem o que pensam em papel de seda muito colorido, mas, no fundo ... No fundo, o cancro está lá ... O mal não foi erradicado. Os descendentes dos autores não morreram. Têm é, não raro, outros cognomes.
Em suma: no banco de jardim, as conversas de jardim, de facto, não curam, mas tentam, sempre que possível, assumir-se como eventuais, quiçá quixotescos, tranquilizantes - não vá, por exemplo, S. Bento, aqui bem perto, lembrar-se de os abordar, sabe Deus p'ra quê ...
Ao menos, AQUI, a gente fala, fala, fala e ... e não acontece nada de mal ...
É claro que (já se percebeu) alguns fogem ... Mas não contam. Andam por aí ... Meio escondidos - porventura, com medo da opinião alheia. A constipar-se, quem sabe?!...
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