domingo, 15 de novembro de 2015

(Des) apontamentos *

* in À Sombra da Minha Latada (1980), de M.A.















Como sabem os que já viajaram de avião de Lisboa ao Porto, ou vice-versa, o voo é efectuado sem que se suba acima das nuvens. Daí que se possa apreciar bem, em dia claro, a paisagem portuguesa que se sobrevoa. Fazê-lo, porém, lendo tranquilamente as passagens mais significativas da história de Portugal, entre duas espreitadelas pela vigias do avião, é um exercício interessante. Com efeito, à terra feita de lugarejos, que a baixa de altitude de voo deixa ver pormenorizadamente, contrapõe-se a história que levamos nas mãos e que se nos apresenta com grandes homens. Visto do ar, dir-se-ia que Portugal é apenas uma "herdade" da Europa a que a história se refere como sendo terra de gente de "antes quebrar que torcer". Se não são necessariamente os países grandes que fazem os grandes homens, resta saber de que são capazes os grandes homens de um pequeno país. Os que a nossa história regista fizeram obra que uma simples viagem ao Porto, ou a Faro, de avião não consegue abarcar. Importa ver o que o implacável tempo vai registar dos homens deste fim de século confinados agora à sua "herdade" europeia ...

Será que para se ter a verdadeira dimensão do Portugal dos nossos dias se tem que sobrevoar a França (das "vacanças"), o Luxemburgo, Alemanha ou a Venezuela? Ou, em alternativa, se terá que passar a andar nas nuvens - para se fugir à realidade interna?

Bom será que, já que estamos geograficamente "condenados" a ser aldeões, o saibamos ser, de facto, à boa maneira lusitana, fazendo agora na nossa "herdade" aquilo que os de antanho conseguiram noutras paragens. Se cada vez que, daqui para diante, quisermos mostrar o valor dos portugueses tivermos que subir às nuvens e rumar por Angola, Moçambique ou Brasil, mal irão as coisas cá pela "propriedade". A história da idade do Supersónico, cada vez menos apenas terrestre, não registará então mais do que a existência, a partir do final do século XX, de uns quantos pobretanas que tinham por hábito discutir reformas agrárias e que eram vulgarmente vistos a pescar, para as bandas de Espanha, em rochas nuas e batidas pelo Atlântico, enquanto nos campos cresciam ervas daninhas - muito bonitas. À beira-mar plantadas ... Ter-se-á, assim, finado aquilo que hoje ainda dá pelo nome de Portugal. E a Revolução de 1640 aparecerá na história a escrever Amanhã como o mais dramático desastre da vida de um povo de marinheiros que um dia sonhou ser grande.

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