* in crónica publicada no livro de M.A., "À Sombra da Minha Latada", em 1980
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"O Buda de Ouro, cujo nome oficial em Língua tailandesa é Phra Maha Suwan Phuttha Patimakon, (พระพุทธ มหา สุวรรณ ปฏิมากร, grande estátua do Buda de Ouro), é a maior estátua de ouro maciço no mundo, e um dos mais preciosos tesouros da Tailândia e do budismo.
Ele está localizado no Wat Traimit, um pequeno templo do Budismo, localizado no distrito de Samphanthawong, no Yaowarat, na Chinatown de Bangkok, na Tailândia."
Chegado à cidade, porém, imediatamente me apercebi de que a missão não seria fácil, pois nem as gentes eram ricas, nem os cheiros reinantes eram a alfazema. Procurei, nessa ocasião, disfarçar este ar europeu, aligeirando o vestir. E assim, tão às escondidas quanto possível, consultei guias turísticos e lá fui até Wat Traimitr de óculos bem escuros para não me verem os olhos de ocidental.
Contrariamente ao que desejara ao sair de Lisboa, dei-me, então, conta de uma quase multidão aguardando vez para observar o buda. Contudo, esperei com paciência a oportunidade de me aproximar. A meu lado, pessoas de todas as cores esperavam ... Apercebi-me, nesta altura, todavia, de era prática entrar descalço no templo. E, receando o pior - corei: a única peça que me identificava como português estava encoberta e era essa que tinha que pôr "à vela". Indaguei, por isso, com o maior cuidado se tinha mesmo que ser e, face à impossibilidade de recuo, sem perder o controlo, tirei as botas e, com elas, as peúgas rotas no dedo grande que, ao engalanar-me à partida, não conseguira evitar na minha bagagem para "tailandez ver". Foi, pois, com o respeito que só a verdade da nudez torna absoluto que, calos ao léu, entrei humilde e temente, em Wat Traimitr e me prostrei aos pés da Figura Enorme, enquanto meus pensamentos se voltavam para a Ocidental Praia que deixara distante e sorumbática, contando as últimas barras de ouro depositadas nos cofres do mui nobre e digno Banco de Portugal. Diante de mim estavam agora cinco toneladas, cinco mil quilos do precioso metal - feitos buda. Olhei, enfim, à volta para ver se alguém estava a reparar no que eu fazia e, cristão, por amor à minha terra, ali prometi converter-me ao budismo em nome dos mais altos e sagrados princípios patrióticos. Descalço, olhos esbugalhados, fralda de fora e de joelhos, mil vezes me curvei e outras tantas rezei o que sabia do catecismo da Primeira Comunhão, na doce esperança de que o buda compreenderia a desgraça. Porém, a Veneranda Imagem nem só uma lágrima verteu, nem só um grama de ouro deixou escorrer daqueles olhos profundos e sabedores com que eu sonhara no meio da minha desorientada experiência de português desta segunda metade do século XX.
Contudo, ainda me pareceu, a certa altura, ouvir-lhe dizer:
- Se não estivesse aqui tanta gente, Irmão, eu coçava a barriga e talvez isso te desse sorte ... Assim, não posso: se coço em teu favor, que és ocidental, logo os orientais se acercam de mim rejeitando o arroz que lhes tenho dado...
Compreendi.
Olhei, apesar de tudo, implorante, e mais uma vez, o buda, pensei no meu País, mas, ao ver-me, pouco a pouco, rodeado de bonzos e de criaturas tão palidazinhas, tão amarelas - perdi a coragem de qualquer aventura e ... desisti de o trazer comigo para Portugal - onde vou, como é óbvio, na primeira oportunidade, mandar passajar as minhas lusitanas peúgas."
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