segunda-feira, 16 de abril de 2012

Letras de protesto











Caranguejola

"Ah, que me metam entre cobertores
E não me façam mais nada!...
Que a porta do meu quarto fique para sempre fechada,
Que não se abra mesmo para ti se tu lá fores!

Lã vermelha, leito fofo. Tudo bem calafetado ...
Nenhum livro, nenhum livro à cabeceira ...
Façam apenas com que eu tenha sempre a meu lado
Bolos de ovos e uma garrafa de Madeira.

Não, não estou para mais: não quero mesmo brinquedos.
P'ra quê? Até se mos dessem não saberia brincar ...
Que querem fazer de mim com estes enleios e medos?
Não fui feito p´ra festas. Larguem-me! Deixem-me sossegar!...

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Desistamos. A nenhuma parte a minha ânsia me levará.
P´ra que hei-de então andar aos tombos, numa inútil correria?
Tenham dó de mim. Co'a breca! levem-me p´rà enfermaria -
Isto é, p´ra um quarto particular que o meu Pai pagará.

Justo. Um quarto de hospital, higiénico, todo branco, moderno e tranquilo;
Em Paris, é preferível, por causa da legenda ...
De aqui a vinte anos a minha literatura talvez se entenda:
E depois estar maluquinho em Paris fica bem, tem certo estilo ...
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... "

Mário de Sá-Carneiro

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