quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Lixo


Final de ano, lixo fora...

Fonte: imprensa de Lisboa e Porto (Hemeroteca de Lisboa). Amostragem.

"Vendido em Macau ( antes de...) remédio com virus da sida."

"Dois automóveis foram esta madrugada alvo de vandalismo no bairro de Campo de Ourique."

"Detido quando tentava roubar e violar idosa."

"Sistema de castas mergulha a India numa crise social."

"Um mal maior que nações conseguirem um arsenal nuclear está em terroristas passarem a ter matéria-prima bastante (15 quilos de urânio enriquecido ou 4 quilos de plutónio) para construirem uma bomba atómica."

"Uma multidão de muçulmanos ateou fogo a várias igrejas após incêndios em duas mesquitas atribuídos a cristãos."

"Em Portugal, cerca de 2 milhões de pessoas adormecem, todas as noites, com fome."

"Um indivíduo de 19 anos, assassinou a madrasta e tentou matar o pai para receber o dinheiro da herança."

"Há por aí toneladas de explosivos em "boas mãos".

"Derrame de crude inunda praia de..."

"A família, enquanto instituição, está a ser agredida e assaltada por erros que esvaziam os seus fundamentos essenciais."

"Cento e quarenta e três homicídios foram registados (...) durante as festas de Natal."

"Jovem de 15 anos foge com polícia."

"1000 idosos abandonados nos hospitais. Desprezo familiar aumenta nos períodos da Páscoa, Verão e Natal."

"Um jovem de 17 anos apresentou-se à PSP e confessou ter morto, "a soco e pontapé" um sexagenário."

"As polícias espanholas e marroquinas já se habituaram à rotina de resgatar os mortos que o mar devolve."

"Na Primavera mata-se e no Verão rouba-se."

1989: " O Brasil já destruiu 343 900 quilómetros quadrados de selva amazónica, cerca de quatro vezes a área territorial de Portugal continental."

Nota* ao Prof. Marcelo


Breve, como impõe a NET. E apenas, por conta própria, para fazer um pedido... para os outros.Ou melhor, para todos nós...

Neste último dia de 2009, a primeira NOTA na ruadojardim7: posto que, pessoalmente, só interesses de cidadania me movem (sou voluntário e nessa EXCLUSIVA qualidade tenho procurado fazer alguma coisa pela CERCI Lisboa), venho antecipadamente agradecer-lhe que, no seu programa semanal na RTP, veja se pode dar notícia que o livro CONVERSAS DIFERENTES, que tive o prazer de lhe enviar em tempo oportuno (e de que sou autor contra ZERO euros), está à venda na própria CERCI Lisboa e pode ser-lhe telefonicamente solicitado para os números 218 391 700 ou 217 169 266.

A CERCI e os deficientes intelectuais, que tive o prazer de entrevistar, precisam do seu apoio.

Bom 2010!


* apontamento, bilhete, comunicação, escrito, lembrança, lembrete, resumo, pedido, solicitação.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Subsídios para a História - Macau 95 (II)


HOMENAGEM PÓSTUMA

ENTREVISTA com Monsenhor Manuel Teixeira (cont.)


Monsenhor, há algum aspecto que, além das razões históricas, singularize Macau das regiões vizinhas?

Macau foi sempre uma terra "sui generis", quer dizer, os portugueses vieram para aqui, nunca houve guerra.É interessante salientar que, o próprio Mao Tzé Tung, quando andavam com críticas, "porque não ocupam Macau", disse: "Macau é diferente de Hong Kong". Nunca os portugueses fizeram guerra à China, nunca! Viemos para aqui em 1557, mas o imperador da China só soube que nós estavamos em Macau em 1582. Portanto, essa balela que o imperador concedeu Macau aos portugueses é mentira, é falsa. Não concedeu, nem podia conceder, porque ele não sabia da existência de Macau.

Só, portanto, 30 anos depois da nossa estada aqui é que, em Pequim, se soube que os portugueses estavam em Macau. Então como é que foi?... Viemos para aqui e começámos a fazer negócios com a China. Na China havia, como ainda há hoje, duas feiras comerciais anuais. Os portugueses vinham de Goa, de Malaca e levantavam umas tendazinhas, depois, iam a Cantão, comerciavam, compravam sedas, traziam a mercadoria para Macau, daqui levavam-na para o Japão e depois para Goa.

E assim foi, sem guerra nenhuma e com a tolerância - tolerância, é a palavra - das autoridades chinesas que sabiam (das autoridades da China do Sul, o vice-rei...) que Macau existia, mas sem permissão oficial (aliás, nem o vice-rei podia dar essa permissão. Só o imperador, que não sabia de nada...). Ora deu-se o seguinte: em 1564, os piratas, ajudados pelos piratas japoneses, cercaram Cantão e o vice-rei, que não podia libertar-se dos piratas e do cerco, pediu ajuda aos portugueses de Macau.

Portugueses de Macau, Manuel Pereira e seu irmão, António Pereira, fizeram, então, duas esquadras e foram a Cantão e com os canhões bombardearam os piratas. Os piratas não conheciam, de forma alguma, a artilharia e, quando ouviram esse bombardeamento, fugiram todos...E assim Cantão salvou-se. E foi a partir dessa altura (1564) que o vice-rei de Cantão e as autoridades chinesas nunca mais nos incomodaram. Não deram nenhum documento oficial para os portugueses estarem em Macau, mas toleraram (a partir de 1564) a nossa presença. Desde essa data, nunca houve interferência nenhuma da parte dos chineses para nos expulsarem de Macau. E aqui continuámos. Continuámos... Só em 1587 é que, oficialmente, Tomás de Sousa Rosa, que havia sido governador de Macau, foi nomeado nosso diplomata junto da corte de Pequim para assinar um tratado oficial em que se diz: "a China reconhece a perpétua ocupação de Macau pelos portugueses, como qualquer território português". Isto contra o que se argumenta por toda a parte.

Mas em 1987, precisamente quatro séculos depois, foi o nosso primeiro-ministro, Cavaco Silva, que foi a Pequim e assinou a chamada Declaração Conjunta, em que se diz que Macau é território chinês.

Portanto, desde 1987 é que é território chinês. Antes não era. Era território português.

E então, como disse, Macau tem sido sempre o refúgio de todos os perseguidos e durante a Guerra, não só durante a Guerra, a China foi ocupada pelos comunistas e os missionários (todos), estrangeiros, as religiosas. Foram todos expulsos da China. E Macau foi novamente o refúgio de todos eles, quer padres, quer madres, vieram todos para Macau. O território está cheio de missionários estrangeiros.

De maneira que a grande glória de Macau é ter sido zona de acolhimento.

Quanto à identidade de Macau é esta: os portugueses deram-se sempre bem, nunca fizeram guerra à China, sempre pacíficos. Os chineses também, com o negócio que faziam com os portugueses estavam imensamente satisfeitos e, portanto, com paz contínua.

Decorridos estes séculos de convivência racial, o que é que vai permanecer?

Na minha opinião, a língua, mas vai ser muito difícil manter-se. Será absorvida. Somos uma gota de água no meio de um oceano tremendo. Há um bilião e 300 milhões de chineses. Ora isto vai absorver completamente a nossa gente e nós, infelizmente, nunca tivemos aqui em Macau a cultura e língua portuguesas, porque muitos não compreenderam. Embora fosse verdade que não precisávamos: o negócio estava todo nas mãos dos chineses, todo. Não havia negócio português, não havia coisa nenhuma nas nossas mãos e, portanto, os portugueses só compravam aos chineses o que precisavam e não precisavam de falar...Os chineses também não precisavam de aprender português porque não tinham nenhumas relações comerciais com os portugueses e, portanto, houve sempre separação, embora amigável. É claro, que também não houve convergência de culturas nenhuma. A única convergência que houve foram as visitas que, de Macau, fizemos, em 1583, à China. Sabe-se que estivemos em Pequim em 1610. Eram grandes sábios que levantavam então o Observatório Astronómico de Pequim (foi levantado pelos jesuítas) e ali reformaram o calendário chinês, porque toda a vida social e política do país girava à volta do Calendário. As suas festas, etc. etc., eram todas determinadas pelo Calendário.

Os jesuítas descobriram erros no Calendário, reformaram-no completamente e a China adoptou-o oficialmente. Foram os portugueses, na pessoa dos jesuítas, que levaram à China a cultura europeia. Houve jesuítas que traduziram para o chinês as grandes obras de Euclides, obras de Matemática de Euclides, as grandes obras dos gregos. Depois as obras europeias e tudo isso foi introduzido na China pelos jesuítas.

Este foi o grande contributo intelectual e cultural de Macau para com a China, e a China reconhece, e tem de reconhecer, porque ainda hoje existem relíquias desse Observatório Astronómico em Pequim, que está bem conservado. Lá temos também as nossas igrejas restauradas pelos chineses, temos lá um cemitério que o imperador deu em 1610 aos jesuítas, onde estão sepultados todos os padres portugueses lá falecidos.

Mas esta fúria, diria, de construção de monumentos, um aqui, outro acolá, esta febre, estes programas de televisão que ensinam português aos chineses e cantonês e mandarim aos portugueses... O que é que vai permanecer?...

Os portugueses são sempre os "homens do caldo verde..."

???

Vai fazer-se tal coisa... Sim, senhor!... Não se preparam. Na véspera, cozinha-se um caldo verde e pronto...Deveriamos treinar mais... Mas não: um mês antes começa tudo a correr... Resultado, nunca damos nada...É a tal coisa do caldo verde: à última hora, está tudo cozinhado e... Agora a mentalidade portuguesa é esta: a árvore das patacas...

Estamos aqui por causa da pimenta?...

Esta febre toda é uma febre momentânea que se orienta pelo "levem quanto puderem..." Mas isso não é para ficar, é para levar... E, portanto, o patriotismo dos portugueses é encher os bolsos e levar para Portugal...

Afinal, Portugal em Macau tem sido missão, pimenta, aventura, o quê?...

Bom, foi cultura...

Está, então, a ser pimenta?...

Sim...

E tem alguma coisa de aventura?... Tem alguma coisa de Fernão Mendes Pinto?...

Agora é muito fácil... Agora não há Fernão Mendes Pinto. Agora há um avião que sai de lá ontem e chega cá hoje... Pronto!...

.../...








terça-feira, 29 de dezembro de 2009

"Bom dia, vizinho!..."


"Ah, que ninguém me dê piedosas intenções
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui!"
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei por onde vou
Sei que não vou por aí!"


in Cântico Negro
de José Régio*




* que minha mulher, que morava na casa ao lado, durante anos, viu passar por ali, à sua porta, em Portalegre "... cidade onde então sofria..."

"Quarto de Despejo" - pavor


Um grito de Catarina:

"...A coisa que eu tenho pavor é de entrar no quartinho onde durmo, porque é muito apertado. Para eu varrer o quarto preciso desarmar a cama. Eu varro o quartinho de 15 em 15 dias."

Pensionistas


No espaço acanhado da papelaria, a pressa de vender o modelo certo:

- Aqui tem: os impressos para o IRS. "Trabalhadores por conta de outrém e pensionistas."

- Correcto. Obrigado: "pensionistas, isso, os que pensam muito..."

Encheu-se de sorrisos o espaço a cheirar a papel e ao desodorizante da jovem do balcão. E foi tudo naquela véspera de confissão fiscal.

Carta aberta a Helena Vasconcelos


Carta aberta, amiga Helena Vasconcelos, por três razões:

1ª - Para, numa altura em que se prepara para animar mais uma Comunidade de Leitores, na CULTURGEST, lhe dizer "publicamente" quanto aprecio o trabalho de animação a que toda se entrega com a maior simpatia - e saber;

2ª - Para lhe manifestar, do alto dos meus mais de 70, o especial interesse em a, em vos, saber a falar de "Reivindicação do Amor";

3ª - Para lhe confidenciar a minha falta de tempo para acudir não só a uma ruadojardim7.blogspot.com
"exigente", como, para nos dias aprazados, chegar aí com as "lições sabidas" para dar ao Amor tudo o que o Amor pede - "tal como o entendemos no mundo ocidental."

Um abraço do M.A.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Subsídios para a História - Macau 95 (I)


HOMENAGEM PÓSTUMA

ENTREVISTA com Monsenhor Manuel Teixeira

Monsenhor Manuel Teixeira, fale-me um pouco de si... Do percurso nesta terra que adoptou. Sei que é um homem de Freixo de Espada à Cinta...

Vim de Freixo de Espada à Cinta com um grupo de rapazes que pretendia tirar o curso sacerdotal, eclesiástico, que, aqui, em 1924, era gratuito: dormida, alimentação e estudos. Desses seis rapazes, só eu estou vivo e um outro que saiu quando era seminarista. Não se ordenou. Era sobrinho do almirante Sarmento Rodrigues. Chamava-se Eduardo Augusto Massa. Esse rapaz sentiu grandes dificuldades durante o curso e teve que deixar o seminário. Depois foi para Timor como missionário leigo, lá casou, teve filhos e hoje está em Lisboa, corcunda.

Os outros foram assassinados pelos japoneses. Dois em Timor, outro morreu na cadeia em Singapura, preso e torturado. E o outro deixou de ser padre, casou-se pela igreja e morreu também. De maneira que sou o único abencerragem desse grupo que há 71 anos veio de Freixo de Espada à Cinta.

Tenho passado a vida em Macau, com excepção de 15 anos em Singapura, que foram os mais belos de toda a minha vida. Até lhe chamo a minha lua de mel... Na verdade, Singapura tem uma comunidade portuguesa de milhares de pessoas que são todas católicas, pessoas de comunhão, com um respeito infinito pelos padres. Padre é para eles o patriarca antigo que resolve todas as questões, sem que seja preciso ir a tribunal...

É uma terra abençoada. Ali passei 15 anos. O resto foi tudo em Macau.
Quando eu vim para cá, eramos uma espécie de aldeia portuguesa. Todos nos conhecíamos. Umas 150 000 pessoas, mas afastados, separados da parte chinesa. A parte chinesa era a de S. Lázaro; a parte portuguesa, da avenida Almeida Ribeiro até à Barra. Ainda hoje esteve aqui comigo o Dr. João Filipe, que é filho do grande romancista Joaquim Paço d'Arcos, e eu estive a recordar esses tempos do autor de Ana Paula e doutros romances. Há uns dez anos veio cá também a viúva do Joaquim Paço d'Arcos, que é a Maria da Graça, e andei a mostrar-lhe Macau. Mostrei-lhe os locais todos por onde seu marido andou e ela ficou encantada.

E como o Joaquim Paço d'Arcos casou duas vezes, a primeira com a Maria Cândida, filha do almirante Magalhães Correia, mostrei-lhe também o local onde ele namorou essa primeira mulher. Ela gostou, evidentemente. Disse-o ao filho.

De maneira que conheci esta gente toda em Macau, que era uma aldeola em que a comunidade portuguesa vivia à parte da comunidade chinesa. E é curioso saber que havia apenas uma loja portuguesa: um bar...

Estamos no ano...

Estamos em 1924. Havia, como disse, apenas um bar, era o Bar do Ananias, na rua do Campo. Tínhamos também o Banco Nacional Ultramarino, que foi fundado em 1903 e esse continuou, mas, já no meu tempo, foram construídas novas instalações na avenida Almeida Ribeiro. O resto estava tudo nas mãos dos chineses. E estavam satisfeitos. Os portugueses não trabalhavam senão nas repartições, eram funcionários públicos. Os chineses trabalhavam muito, como trabalham hoje, e os portugueses, satisfeitíssimos da vida, compravam tudo aos chineses, que tinham todas as lojas nas mãos. Os chineses gozavam imenso com isso porque vendiam os seus produtos. Havia uma satisfação geral. Nunca houve distúrbios nenhuns durante esse tempo.

E as guerras na Europa e aqui?...

Para além da guerra na Europa, em 1941, começou em 1937, aqui,uma guerra porque os japoneses invadiram a China e começaram os bombardeamentos que atingiram a província de Cantão. Então houve meio milhão de chineses que se refugiaram em Macau. Não havia, evidentemente, comida para ninguém, o governo português racionou a comida para os portugueses, o governo inglês pagava aos súbditos um subsídio para alimentação e...e os chineses que se arranjassem porque era impossível sustentar meio milhão de pessoas...Não havia recursos para isso. Resultado: morriam, diariamente, 100 chineses de pura inanição. Sentavam-se na rua, vinha o frio (Macau, no Inverno, é muito frio) e ali ficavam enregelados, sem se saber se estavam vivos ou mortos... De manhã, vinham os carros da polícia e do Leal Senado para transportar os cadáveres, supostos cadáveres, para a Taipa. Metiam-nos em grandes camiões, levavam-nos ao porto, atiravam-nos para umas barcaças que os levavam então para, como disse, a Taipa.

Durante o trajecto, nascia o sol que aquecia aqueles corpos que, nalguns casos, começavam a mexer-se... Não estavam mortos. Quando chegavam à Taipa, abria-se uma trincheira na praia e atiravam os cadáveres para lá. Com o choque que sentiam, alguns mexiam-se, mas estavam lá os soldados landins (havia aqui muitos soldados de África) e então diziam: "então, comandante, você está morto e está a mexer-se?... Não pode ser..." E cobriam tudo com areia. O pároco da Taipa, monsenhor António André Gan, confirmou-me a situação...

Depois, outra coisa: como não havia comer, alguns hotéis (por exemplo, o Hotel Central) compravam crianças, cozinhavam-nas e davam-nas a comer aos clientes. Eu tinha um grande amigo, e meu paroquiano (eu era pároco de S. Lourenço), o Dr. Juiz Evaristo Mascarenhas, que me confessou ter ido a um desses restaurantes e lhe terem proposto uma refeição de carne humana. "Muito saborosa", segundo o próprio juiz. A fome é má conselheira...

Meu caro Monsenhor...

Eu próprio, um dia, quando voltava da Ilha Verde, chamei um barco - os chineses chamam-lhe Tan-Ká, barco de família, e o Tan-Ká recusou-se... Então, eu berrei, dizendo que pagava... Por fim, ele veio à praia e quando entrei na barcaça verifiquei que estava cheia de cadáveres com um círculo vermelho à volta do peito. Que significava isso? Significava que tinham tirado os pulmões, o coração, as entranhas dessa gente toda para cozinhar... E agora levavam os restos mortais, sem entranhas, a enterrar.

Aqui no Hospital de S. Januário, onde agora estamos * vinha todas as manhãs um homem buscar as crianças que morriam...

É claro que isso não foi publicado, por que, se alguém publicasse, a polícia intervinha de imediato e prendia os donos dos hotéis. Eram rumores que circulavam por toda a parte, mas não se podiam publicar nos jornais. Mas toda agente sabia. De maneira que, quando, há uns meses, eu escrevi isso num jornal local, um inglês de Hong Kong, que se diz historiador (afirmou-se mesmo investigador histórico), referiu-me "nunca ter visto isso em parte nenhuma..." É evidente que ele nunca poderia ter visto isso escrito, porque isso nunca se escreveu durante a guerra, visto que a polícia prenderia qualquer suspeito, qualquer pessoa incriminada nesse negócio. Mas eu presenciei pessoalmente e muita gente ainda viva veio a dizer que é verdade aquilo que eu escrevi. Essa historietazita correu o mundo inteiro e foi até publicada nos países árabes. Recebi mesmo um recorte desses países em que vinha essa história das crianças cozinhadas durante a Guerra.

Esse tempo foi o pior da história de Macau, de quatrocentos anos.

E porque é que os chineses vinham para Macau? Bem, eles preferiam morrer de fome, a morrer debaixo das bombas. Era tudo bombardeado. Os japoneses bombardeavam a China do Sul e eles pensavam então que melhor seria morrerem sem bombas e vinham para Macau e aqui encontravam um lugar onde poderiam ficar... Mas era impossível sustentar essa gente... Foram tempos terríveis, todos julgavam que era o fim de Macau, como agora que está tudo com medo de 1999 e o que acontecerá depois...

Bom, já aconteceu durante a Guerra. Mas nunca os japoneses ocuparam Macau, nunca... É que tivemos sempre o nosso governador, que era o Gabriel Teixeira, as nossas autoridades, a nossa polícia. Nunca os japoneses ocuparam Macau. E Macau foi o centro de refúgio para todos os foragidos da tormenta: eram alemães, eram ingleses, eram franceses. De Hong Kong, de Xangai, de Cantão. Veio gente de toda a parte acolher-se a Macau, porque as suas terras estavam ocupadas pelos japoneses e não se podia viver. Foi um tempo terrível, esse.

.../...

* Monsenhor Manuel Teixeira, a certa altura, terá adoecido e passado como que a "residir" no hospital, onde meu deu a longa entrevista que aí há-de ir aparecendo - para, a seguir, dar lugar a outras que, hoje, no seu conjunto, ajudam a fazer História.
Será uma longa tarefa que irei deixando sair sem medo de eventuais falsos editores - que, se aparecerem, alguém há-de acabar por denunciar. Fica dito.

Até breve!

domingo, 27 de dezembro de 2009

Bordéus 2004 - apontamentos (V)


FINGIR DE EMIGRANTE



Eventual madureza de cidadão comum, podia-nos ter dado para pior, mas, em vez de Paris ou outra grande cidade "de toda a gente", a minha mulher e eu, escolhemos uma terra onde fosse relativamente fácil todos encontramos todos...Os emigrantes, claro. Optámos por Bordéus. Não se percebe muito bem, de resto, se há lá franceses...


Um mês de estada, em "aparthotel", com "necessidade" de ir ao mercado, à padaria, de andar nos transportes públicos (com "passe" desde o primeiro dia, etc), de visitar a cidade, de conviver com os nossos, de ir às suas festas, de frequentar as igrejas dos seus bairros, de lhes falar na nossa língua, de lhes lembrar a terra que deixaram... De...de...


Bateu certo!...


Do contexto, apontamentos:


"De registar a alegria dos feirantes portugueses ao serem visitados por nós, vindos "de lá..."


"As mulheres, de uma maneira geral, não usam meias. E os sapatos são rasos. Mulher com saltos altos, em regra, tem saia curta e, se não dá nas vistas, não usa nada que a abone..."


"Atravessei, às 19 horas, bem sei que em dia feriado, a rua de Santa Catarina (a maior da cidade), de um extremo ao outro e, embora de impermeável amarelo brilhante, ninguém deu mostras de reparar em mim... Em tarde de céu muito nublado, noto..."


"À minha frente, uma sexagenária pediu um branquinho - em copo de pé alto. Trouxeram-lhe também uns amendoinzinhos para fazer boca... Não de pode concluir, pela cara, que se mete nos copos..."


"Dizem-nos em Portugal que o 112 é o número europeu de emergência, mas em Bordéus o que vejo nas ambulâncias é o 33. A França está dispensada? É só quando quer?...

E os táxis têm que ter cor creme? Mas aqui? Aqui, não! Creio mesmo que os há de diversas cores."


"Em mais de 20 dias em transportes públicos, ainda não vi ninguém a controlar títulos de transporte..."


"O rapaz que, na esplanada, ensaia viola, canta em surdina. Ninguém liga..."


"Um coxo "resolveu" o seu problema andando de "trotinette". O cão que o acompanha, acompanha-o na velocidade moderada a que anda o dono. A cidade é plana, o que facilita..."


"No "Le Monde", a propósito do Festival de Cannes, pode ler-se, a toda a largura, no topo de uma página dedicada à Cultura, a seguinte frase: "Amor a contra-relógio no quarto de hotel".


"Frases:
- Ataquemos as exclusões
- Partilhemos as riquezas, não as misérias
- A FN defende os capitalistas, não os trabalhadores, nem os excluídos
- Desobedecer às leis xenófobas e securitárias
- Resistir à extrema-direita e e ao racismo
- Não submeter à ditadura da economia e do mercado"


"No combóio, as pessoas, que já vinham sentadas com volumes nos bancos vazios, acomodaram-se e foi com dificuldade que os tiraram para deixar sentar pessoas idosas recém-chegadas..."


"O combóio, na ida e na volta, partiu e chegou, rigorosamente à hora prevista."


"Apesar de ser uma festa anual, não me pareceu que estivesse alguém do consulado português numa igreja cheia de...de portugueses."


"Nos arredores de Bordéus, umas cinco mulheres magrebinas estavam sentada num jardim, com uma cafeteira grande e uma caixa de biscoitos à sua beira, a beber chá. Nem me viram..."


"Enquanto o carro de transporte de valores não fez a totalidade da manobra para sair do local onde estava, o ajudante do motorista manteve-se no exterior com a mão numa pistola que tinha à cinta."


"Na Praça da Vitória, manifestação organizada pela CGT: uns 100 trabalhadores
contra as medidas do governo a propósito da Segurança Social. Tudo com comes e bebes (salsichas, febras e copos). Tudo a trincar..."


"Emílio Zola é nome de rua muito afastada do centro da cidade."


Basílica de St. Seurin, em Bordéus:
"Aqui repousa
Messire Martial François
President au Parlement de Bordeaux
Inhumé le 30 Novembre 1787
Requiescat in pace"

sábado, 26 de dezembro de 2009

Notícias da Austrália


Amável, como sempre (bem vistas as coisas, estivemos juntos no encontro "Os Portugueses no Mundo - Uma Cultura a Preservar", mas foi com a minha ida à Austrália e as suas posteriores vindas a Portugal que consolidámos aquela que é hoje uma amizade que me honra), o Dr. Carlos Lemos, Cônsul Honorário de Portugal e Secretário Honorário do Corpos Consulares de Melbourne, teve a amabilidade de, com suas simpáticas Boas Festas, me enviar recortes de "O Português na Austrália", de que aqui, com o maior prazer, me faço eco.


"Recepção Cívica do Premier de Victória aos Portugueses no Dia de Portugal" .


Disse-se, nomeadamente...


"Premier" de Victoria, senhor John Brumby:

"Os Portugueses têm contribuido para o nosso Estado..."


Embaixador de Portugal, Dr. António Jorge Mendes:

"Portugal , na área do Ambiente, vai investir dois biliões de dólares em energia eólica"


Cônsul Honorário de Portugal em Melbourne, Dr. Carlos Lemos:

"Quando se fala em revoluções fala-se sempre em sangue. Em Portugal, na revolução de 25 de Abril de 1974, que pôs termo a cerca de 50 anos de ditadura de Salazar, não houve mortos. Isto diz algo do carácter dos Portugueses."


No final, claro, no final, cantou-se... cantou-se o fado, lê-se na reportagem, com mais imagens (elucidativas) do que palavras.


Mas há mais:


Lançamento, na Austrália, de um livro sobre a História de Portugal


Autor: Dr. Anthony Disney, professor durante 26 anos, nomeadamente, nas Universidades de Melbourne e Latrobe, que "dedicou 10 anos da sua vida ao estudo profundo da nossa história." Do seu trabalho acerca de Portugal, terá dito o historiador Sir John Elliot, da Universidade de Oxford, "A.R. Disney produziu dois volumes impressionantes sobre a história de Portugal (...) Obra erudita, actualizada e coerente na exposição, misturando habilmente narração e análise..."


Bem-haja, Dr. Carlos Lemos, pela notícias que nos fez chegar. Que este blogue as faça navegar agora até longe. Ou perto -a algum descrente, desses que não sabem fazer países...E levam a vida a dizer mal de tudo...


Para já, SAÚDE!


Cá o espero em 2010. Valeu: "almoçarada no Grémio Literário". Entretanto, convido-o a aparecer nesta Rua, onde, no Jardim, há uma sombra tranquila que nos pode acolher...





Frases


"O meu coração há-de florir num espinheiro. Será num sítio pobre, mas alguém que passe nesse Abril, sentir-se-á enternecido para sempre. O meu cérebro procurará o teu cérebro para vogarmos juntos na mansidão dum rio. Ora em terra, ora em pedra buscar-te-ei inconscientemente até dar contigo e te fruir nesse oceano bravio."

in "Os Pobres", de Raúl Brandão

"Quarto de Despejo" - visinhos de alvenaria


Que coisa terrível esta, Catarina: tu escreves, eu transcrevo, ele transcreve, nós abominamos, os ricos dizem detestar, Lula é votado, o Brasil apresenta melhores estatísticas nacionais, mas a favela continua, a droga prolifera, o jogo do bicho está para ficar - e o Carnaval também. À noite não podemos parar nos sinais vermelhos de trânsito por causa dos assaltos...Mas o Rio de Janeiro é das cidades mais bonitas do Mundo... O que fazer a tudo isto, Presidentche? O que é que achas, Catarina? Terão algum interesse para os favelados as passagens do "Quarto de Despejo" que aqui tenho vindo a deixar? Talvez, Catarina, talvez! Talvez estejamos perante a história das duas rãs que caíram num vaso de leite: uma morreu logo afogada; a outra tanto deu às patas que se salvou com a nata que fez...

Prossigamos...Até que a nata lhes doa...

"...Os visinhos de alvenaria olha os favelados com repugnancia. Percebo seus olhares de odio porque eles não quer a favela aqui. Que a favela deturpou o bairro. Que tem nojo da pobrêsa. Esquecem êles que na morte todos ficam pobres.

O que eu sei é que a praga dos favelados pega. Quando nós mudamos para a favela, nós iamos pedir agua nos visinhos de alvenaria. Quem nos dava agua era a Dona Ida Cardoso. Treis vezes vêzes ela nos deu agua. Ela nos disse que nos dava agua só nos dias uteis. Aos domingos ela queria dormir até mais tarde. Mas favelado não é burro. Foi vacinado com sangue de burro.Um dia foram buscar agua e não encontraram a torneira do jardim, onde os favelado pegava agua. Formou-se uma fila na porta da Dona Ida. E todos chamavam:

- Eu queria agua para fazer a mamadeira. Meu Deus, como é que nós vamos fazer sem agua?

Nois iamos noutras casas, batiamos na porta. Ninguem respondia. Não aparecia ninguem para nos atender, para ouvir isto:

- A senhora pode nos dar um pouco dagua?

Eu carregava agua da rua Guaporé. Do deposito de papel. Outros trasia agua do Serviço, nos garrafões."

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Dia de Natal


Hoje é dia de ser bom
É dia de passar a mão pelo rostos das crianças
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.
É dia de pensar nos outros, coitadinhos, nos que padecem
de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a sua miséria
de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem.
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Na branda macieza
da matutina luz
aguarda-o a surpresa
do Menino Jesus
Jesus
o doce Jesus,
o mesmo que nasceu na manjedoura,
veio pôr no sapatinho
do Pedrinho
uma metralhadora.
Que alegria
reinou naquela casa em todo o santo dia!
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Dia de Confraternização Universal,
Dia de Amor, de Paz, de Felicidade,
De Sonhos e Venturas
É dia de Natal
Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.


(António Gedeão)

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Cantigas para Portugal Flutuante




M A D E I R A


Hei-de voltar à Madeira
Colher flores p'lo Natal
E regressar à braseira
Com saudades do Funchal

Com saudades do Funchal
E das ondas do mar alto
Das curvas do litoral
Nas serpentes do asfalto

Nas serpentes do asfalto
Onde cantar apetece
Baixinho, sem sobressalto
Como quem reza uma prece

Como quem reza uma prece
Hei-de voltar à Madeira
Paisagem que não esquece
Mesmo ao fogo da lareira


A Ç O R E S

Hei-de voltar aos Açores
Azul das Sete Cidades
Canteiro p'ra nove flores
Penedos de mil saudades

Penedos de mil saudades
E de pavores também
Arquivo d'ansiedades
E de sorrisos de mãe

E de sorrisos de mãe
Em rostos de cinza feitos
Nas furnas que o vulcão tem
Junto a verdes parapeitos

Junto a verdes parapeitos
Em nove grandes amores
Nove sonhos, nove leitos...
Hei-de voltar aos Açores

Marcial Alves

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

MACAU - subsídios para a história


Numa altura em que passaram dez anos sobre a data em que Macau deixou de ser Portugal, vou, como aqui prometido, à procura das conversas inéditas (1995) que deixei amadurecer no meu baú de memórias e, ao longo dos próximos meses, em primeira mão (aceitando transcrições posteriores com indicação da fonte), dar-lhes a visibilidade que as personalidades ouvidas, e/ou a sua memória, merecem e Macau justifica.

São entrevistas longas, que ocuparão várias páginas NET. Opto, por isso, pela sua publicação LENTA (a partir do próximo dia 28 ), que o espaço luminoso (e rápido...) dos "écrans" não aconselha outra solução.

Espero, entretanto, que a autenticidade e o eventual valor histórico (e sentimental) do a publicar, conquistem os internautas que os entrevistados merecem.

Aqui vão "sentir"...

Monsenhor Manuel Teixeira, entretanto, falecido

Padre Lancelot

Arq. Manuel Vicente

Dr. Senna Fernandes

António Conceição Jr.

entre outros...

Boas viagens! Espero a participação de quantos o puderem fazer.

Os Portugueses no Mundo - Uma Cultura a Preservar


A inveja, sabe-se, não tem limites. A paciência, essa, tem. Mas nunca é tarde para clarificar o que interesses sociais, políticos ou intelectuais turvaram, nem que tenha sido há largos anos, como é o caso objecto deste breve apontamento. Estou à vontade. Com a idade que está expressa logo no início destas minhas intervenções na NET, não preciso de me pôr em bicos dos pés para nada: o que fiz, fiz...O que não fiz foi, eventualmente, por falta de talento. Mas o que é meu, é meu!

E a verdade é esta: depois de uma volta ao mundo efectuada em 1980, ao serviço do jornal "O DIA", cheguei a Portugal transbordante de entusiasmo pela riqueza humana encontrada em contacto directo com os nossos compatriotas da Diáspora. Disso mesmo, aliás, procurei dar testemunho em vários suplementos naquele matutino, mais tarde publicados em livro, editado pela Secretaria de Estado da Emigração. Foi, assim, possível, ao longo de meses, congregar colaborações intelectuais e políticas, nacionais e estrangeiras, que, honrando o jornal, muito me gratificaram. Mas não é disso que se trata.

O que me traz hoje à ruadojardim7 é isto:

relegado para o mais profundo anonimato, quiçá, por força dos entusiasmos criados e ambições políticas despertadas, é minha a ideia de, na sequência da experiência havida, dar contributos para a realização em Portugal, em 1983, do encontro "Os Portugueses no Mundo - Uma Cultura a Preservar", que acabou por levar ao Porto (Fundação António de Almeida) dezenas de compatriotas nossos, de uma forma ou outra, ligados às coisas da Cultura nas Cinco Partidas do Mundo.

De 25 a 27 de Março de 1983, vale a pena, apesar de tudo, registá-lo, o Portugal Grande, de que "temos dias", foi possível...

Ora, caríssimos leitores, antes que para aqui comece a divulgar as entrevistas que fiz em Macau, e que muito me sensibilizaram, é bom que se reafirme que excesso de modéstia é parvoíce... Portanto, o anonimato a que me reduziram os galifões da organização nortenha (e lisboeta: Secretaria de Estado e...e partidos) não foi justo, mas fica esclarecido. De resto, sei que os tempos, nestas coisas, não mudaram e que, por exemplo, nalguns casos, assumir voluntariados, em determinadas organizações, é quase afronta para muitos... Mas isso são outros contos, a que talvez um dia volte...

Agora o que me interessa é apenas isto: o encontro no Porto, em 1983, OS PORTUGUESES NO MUNDO - UMA CULTURA PRESERVAR, que levou à Invicta dezenas de personalidades da lusa cultura, não foi ideia dos que sempre estiveram na Mesa...Presidida, quase sempre, pelo
secretário de Estado da Emigração, José Vitorino, lembro-me bem. Fiquei a conhecê-lo. De vista...Valha a verdade que a própria Comunicação Social pouco comunicou e dos ilustres que estiverem, vindos de longe, pouco se soube...Mas estiveram (e eram ilustres...) - mesmo sem câmaras da televisão e outras, que primaram pela ausência.

É tudo. Fica na NET. Para netos...

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

"Quarto de Despejo" - o dentista


Boas Festas, Catarinas, onde quer que estejais! No Brasil, em África ou numa qualquer Lisboa dos disfarces...

"...Mandei o João comprar 10,00 de queijo. Êle encontrou-se com o Adalberto e disse-lhe para êle vir falar comigo. É que eu ganhei uma tabuas e vou fazer um quartinho para eu escrever e guardar os meus livros.

Eu sai e fui catar papel. Pouco papel nas ruas, porque outro coitado tambem está catando papel. Êle vende o papel e compra pinga e bebe. Depois senta e chora em silencio. Eu estava com tanto sono que não podia andar.

Dona Anita deu-me doces e ganhei só 23,00. Quando cheguei na favela o João estava lendo gibi. Esquentei a comida e dei-lhes. O barulho noturno que ouvi: as mulheres estavam comentando que os homens beberam 44 litros de pinga.

E a Leila insultou um jovem e êle espancou-a. Lhe jogou no solo e deu um ponta-pé no rosto. O ato é selvagem. Mas a Leila quando bebe irrita as pessoas. Ela já apanhou até do Chiclé um preto bom que reside aqui na favela. Êle não queria espancá-la. Mas ela desclassificou-lhe demais. Êle deu-lhe tanto que até arrancou-lhe dois dentes. E por isso o apelido dêle aqui na favela é Dentista. A Leila ficou com o rosto tão inchado que foi preciso tomar pinicilina. (...)

Hoje o dia é de choronas. Aqui reside uma nortista que quando bebe torra a paciência. O filho da nortista arranjou uma namorada. Uma mulher que pode ser a sua avó. A futura esposa veio residir com a sua mãe. Quando a velha bebe fica aborrecendo e discutem.E a velha não lhes dava socego. Êle fugiu com a mulher. E a velha está chorando. Quer o retorno do filho."

O apito


Um dia destes, estava eu na bicha (na fila, que a NET "chega" ao Brasil...) da bilheteira do C.C.B., em Lisboa, atrás de uma senhora de idade avançada, um tanto atrapalhada com as "quinhentas coisas" que trazia na sua mala de mão, quando, olhando por acaso para dentro daquele seu "baú ambulante", reparei que, no meio de tudo, estava um...imagine-se, um apito igual ao dos árbitros de futebol...

Fiz o filme: "o diacho da mulher sabe disto... Se, por qualquer razão, na rua, por exemplo, se sente "apertada" por algum intruso, rapa do apito, alarma toda a gente e...e zás!... O larápio que se cuide..."

Boa!...

Moral da história: saí dali. Fui a uma loja de desporto e comprei um apito - "igual" ao...ao dos árbitros.

E é assim que ando agora por aí: apito ao peito, para o que der e vier...

Senhores guardas, até ao momento, nos últimos tempos, que eu saiba, há, pelo menos, duas pessoas em Lisboa com apitos escondidos... A partir de hoje, depende... Mas estejam atentos!...

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Vai uma manif?...


Os desacordos "obtidos" em Copenhaga são das maiores ameaças à vida na Terra que consigo descortinar para onde quer que me volte nas bibliotecas e hemerotecas a que tenho acesso.


Não se faz!


Passe-se, por isso, a palavra: facilitem-se, organizem-se, enquanto é tempo, viagens para a Lua.


Estude-se, quanto antes, o que há a estudar e abram-se inscrições para fugir daqui...

Estando isto, por cá, com a vossa licença, uma verdadeira ... (isso...), ou esses f.p., que falharam na Dinamarca, tomam juízo ou o melhor é prepararmos a coisa para, em Sta. Apolónia ou em Badajoz, proporcionar às gerações a haver um TGV Interplanetário (T G V I, no caso), que valha, de facto, a pena.

Se assim não puder ser, que metam o "Grand Vitesse" no... no... Isso!... Os meus bisnetos e seguintes, por certo, vão querer mais...E mais é fugir (em Grande Velocidade...) para onde nada, ou quase nada, nem ninguém, começou a ser doido varrido como em Copenhaga, neste início do século 21.

Entretanto, organizem-se manifes por toda a parte...Inclusivé, na China e na India. E noutros locais mais pequenos também, claro. Onde possa haver já gente em processo de desidratação, por exemplo.

Queremos respirar, queremos respirar!

Respiração, sim! Poluição, não! Respiração, sim! Poluição, não!

Todos para a rua, o caminho é a Lua!...Todos para a rua, o caminho é a Lua!...

INTERNET, não! INTERPLANET, sim! INTERNET, não! INTERPLANET, sim!

Cultura...


Confesso. Não sei quem disse: " Cultura é o que fica depois de se ter esquecido o que se aprendeu."

E também não sei ao certo por que me lembrei desta ideia solta...

Mas eu vou contar o que me aconteceu nos últimos dias e pode acontecer que alguma das pessoas com quem estive me ajude a perceber a coisa...

Foi assim: na semana passada, ou na anterior, não posso precisar, jantei com antigos colegas de trabalho, e dentre eles, com vários antigos colaboradores directos. Ouvi-lhes as histórias, revi-lhes os sorrisos, li-lhes a saudade...

Hoje almocei com duas ex-colegas de outro emprego, por sinal aquele em que terminei a chamada vida activa (mentira: ainda mexo...)...

"Cultura é o que fica depois de se ter esquecido aquilo que se aprendeu..." Uhmm... Uhmmm!... Depois de..."

Já sei!!! "Amizade é o que fica depois de se terem esquecido amarguras partilhadas..."Não! Não é bem isto..."...depois de se terem lembrado amarguras partilhadas..." Não! Também não é bem isto...

Talvez melhor e definitivamente: "Cultura é o que fica depois de se ter esquecido aquilo que se aprendeu..."Exactamente! Aquilo que se aprendeu com quem se respeitou. Boa! Os meus Amigos são grande parte da minha Cultura. Da Cultura que a sua Amizade me transmitiu - e permanece, agora avivada por encontros fraternais. À volta da mesa, ou fora dela. Mas sempre onde não morre.

"Amigo é um sorriso
De boca em boca.
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
... ... ... ... ... ... ...
Amigo é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada.

Amigo é a solidão derrotada!
... ... ... ... ... ... ...
Amigo vai ser, é já uma grande festa!"

(Alexandre O'Neil)

domingo, 20 de dezembro de 2009

Frases


"E, por um desses paradoxos habituais da História, o número de fiéis multiplica-se, como uma planta que proliferasse milagrosamente à medida que pioram as condições do solo e do clima."

in "Versículos Satânicos"
de Salman Rushdie

"Quarto de Despejo" - o português


Sinistro é isto tudo, senhores do Poder! Diz-lhes, Catarina...


"...Fui catar papel, levei os filhos. Eu agora quero ter o João debaixo dos meus olhos. Fui na Dona Julita. Ela está em Santo André. Cheguei em casa fiz o almoço. Fui no Senhor Manoel vender os ferros. Ganhei 25 cruzeiros. Comprei pão.

Quando cheguei na favela tinha um português vendendo miudo de vaca. Comprei meio quilo de bucho. Mas eu não gosto de negociar com purtuguês. Êles não têm iducação. São obscenos, pornograficos e estupidos. Quando procura uma preta é pensando explorá-la. Eles pensam que são mais inteligentes do que os outros. O purtuguês disse para a Fernanda que lhe dava um pesdaço de figado se ela lhe aceitasse. Ela não quiz.

Tem preta que não gosta de branco. Ela saiu sem comprar. Êle deixou de vender por ser atrevido."

Adevas e Evadões


Percebo Sócrates que, à sombra das ADEVAS e dos EVADÕES, quer os votos da Sinistra. Já!

Mas compreendo também Cavaco que, para já, quer Adõezinhos e Evinhas - com fartura...

sábado, 19 de dezembro de 2009

Chove. É dia de Natal


Chove. É dia de Natal
Lá para o Norte é melhor:
Há a neve que faz mal
E o frio que ainda é pior.

E toda a gente é contente
Porque é dia de o ficar.
Chove no Natal presente
Antes isso que nevar.

Pois apesar de ser esse

O Natal da convenção

Quando o frio me arrefece

Tenho frio e Natal não.

Deixo sentir a quem quadra
E o Natal a quem o fez,
Pois se escrevo ainda outra quadra
Fico gelado dos pés.

Fernando Pessoa

Bordéus 2004 - apontamentos (IV)


FINGIR DE EMIGRANTE



"Não há, nem nos transportes da cidade, nem em nenhum lugar visitado, aviso para se ter cuidado com gatunos."

"Há indicação na estrada do número de mortos e feridos em desastre rodoviário acontecido num determinado trajecto."

"Para captar "fiéis",a Igreja Evengélica no Cours de la Marne oferece café e água e tem à porta uma banca com programa e...e rebuçados."

"Numa mesa próxima da nossa, na esplanada frente ao Grande Teatro, uma senhora ofereceu à outra um livro (agradecido com um beijinho) que, num relance, vi ser "Casei com um comunista."Apressou-se a, para começar, virar a capa para baixo e, pouco depois, a meter o livro num saco, sem "exibir" a capa que, além do título, tinha o desenho de uma bandeira vermelha (livro formato bolso). Era pessoa dos seus 40/50 anos a quem, entretanto se juntou o marido ... da ofertante. Piadas sobre o comunismo ou...comunismo envergonhado à esquerda?"

"Não se observam - talvez porque, tendo menos sol, gostam dele - marquises que não sejam de origem. Se calhar a "Marie" também não deixa..."

"No "tramway", fim da tarde de domingo: um jovem pôs um dos pés do assento vazio à sua frente (o que é condenado nos avisos dos transportes públicos). Olhei, do outro lado da coxia, para ele e , de repente, para o pé - em falta. Sem dizer nada. Pediu-me desculpa de viva voz e retirou o pé para baixo. Era rapaz para seus 20 anos."

"No caso de conflito de vizinhança, contacte-nos..." lê-se num INFOS VILLE de Bordéus."

"Não vi nenhuma muçulmana com burca, mas bastantes com lenços na cabeça."

"Não me dei conta de muitas cenas amorosas na rua."

"A televisão francesa anuncia que em 2003 houve menos 20,9 % de acidentes de viação do que em 2002."

"É ponto assente que não consentem que se escreva nas paredes. E conseguem-no. Por isso, aparecem cartazes nas paredes "virgens" a dizer: "Murs blancs, peuple muet!" e "Police partout, justice nulle part". Assina: "Collectif pour l'affichage libre".

(Des)apontamentos


Ao certo, ao certo, não sei bem o que acontece nos outros países. É comum dizer-se que "só sabe o que se passa no convento quem lá está dentro".

Ninguém ignora que as agências noticiosas internacionais procuram diariamente radiografar o que de mais importante tem lugar por esse mundo além, mas daí até conseguirem relatar todos os pormenores que permitam juízos claros sobre a realidade que nos envolve, estou convencido de que vai uma grande distância.

Portugal, a seu modo, deve constituir um bicho de sete cabeças para quem nos observe de fora e tenha acesso à nossa imprensa. Na verdade, a circunstância de, num país que parece não ter onde cair morto, surgirem tantos notáveis salvadores da pátria deve dar que pensar. É notável! Mas ao mesmo tempo, internacionalmente preocupante.

Com efeito, numa altura em que, graças à nacional capacidade de endividamento , já por todo o lado os credores começavam a sonhar com a parcela de território que lhes iria caber, já não é a primeira vez que tiramos da cartola uns cidadãos com soluções para tudo...

Atenção, isto pode ser grave! É preciso ter uma certa cautela com a língua e as imagens e não divulgar excessivamente esta lusitana intimidade, sob pena de ninguém nos emprestar dinheiro. Bem sei que não se tem dito em que é que os tais senhores são notáveis e isso pode ser a nossa salvação.

De facto, nada nos impede que continuemos a afirmar as carências do país e a administrá-lo sem outro esforço que não seja o da pedincha. Para tudo são precisos notáveis. Esperemos que ninguém se lembre de ter o mau gosto de descobrir entre nós - e badalar no estrangeiro - gente capaz de, numa arrancada sem paralelo, governar, administrar, gerir reunindo, adaptando, transformando a descrença nacional no único sentido que, no fundo, não interessa aos nossos simpáticos e generosos credores.

Haja Deus!...

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Manuscrito (fragmentos, anos 70)


Pelas minhas contas, os fragmentos manuscritos do borrão da crónica, que a seguir lanço na NET, foram escritos por mim nos finais da década de 70 do século passado. São, portanto, "antiquíssimos"... Mas como estão relacionados com a liberdade de imprensa, achei-lhes graça e, olhem, aí vão...

"Voltava-se para o "outro lado" a amantíssima esposa quando, cabelos em desalinho, D. Nuno À-Brocha deu um pulo da cama, calçou, atabalhoadamente, as chinelas, viu de relance ao espelho do "psyché" a sua expressão iluminada, vestiu à pressa o "robe de chambre" e simulou sair do quarto, ao mesmo tempo que gritava:

- Vou ser o dono de toda a imprensa... De toda!...

- Mas, Nunhinho, cautela, não tropeces. Olha que calçaste as chinelas ao contrário: tens a esquerda no direito e o direito na esquerda...

-Não me digas nada agora, filha. Descansa que já mudo... Mas a direita está no direito... E agora preciso de me concentrar, desculpa!...

-Sim, querido! - respondeu confiadamente a boa senhora, acrescentando: - Vai, meu bem! É o destino da imprensa livre na Lusa Pátria que está em causa. Ficarei lendo tuas crónicas de viagens enquanto pensas...

Retirou-se, enfim, da alcova, D. Nuno À-Brocha levando consigo exemplares de "O Templo" e de "A Gazeta da Alvorada", sua muito recente e inspirada criação.

Esgueirou-se para a casa de banho, voltou a ver-se ao espelho, lavou em água tépida, rapidamente, a cara, passou a mão pelos despenteados cabelos e entrou, por fim, na sala de estar, ainda quente e perfumada pela presença recente e elegante de algumas destacadas figuras da vida portuguesa do momento, que ali tinham estado em amena cavaqueira até altas horas da noite, a seu insistente convite.

Olhou, então, de soslaio, mas embevecido, um dos muitos diplomas com que havia sido distinguido pela Imprensa Internacional, pôs no "robe de chambre" uma rosa e, entre o eufórico e o meditabundo, sentou-se.

A um canto, deitado em cima de uma velha e já desaparecida revista de sua imortal inspiração, permanecia um dos cães da família que, babando-se, olhava o dono.

D. Nuno respirou fundo, sorriu e acomodou-se no "maple" em que se sentara. Abriu um exemplar de oitenta páginas de "O Templo", fez o mesmo a um número, embora modesto, de "A Gazeta da Alvorada" e começou a ouvir, no silêncio da madrugada, uma voz estranha que...
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-A seguir, serve-te também de "A Gazeta da Alvorada" como arma a teu favor. Isto é um país com muitos analfabetos. Dá-lhes, como estás a fazer - e bem! - sempre "caixas altas" e escândalos. Verás que ganhas fama de sabedor. Em breve dominarás a imprensa da tua pátria. "O "Diurno" é uma questão de tempo; e o "Novo Jornal"... Isso, o "Novo Jornal" - aí está!..."

A voz estranha deixou de se ouvir e D. Nuno estremeceu. "Eureka!" O "Novo Jornal"!... Estava justificada a sua insónia, a sua agitação nocturna depois do serão-bem naquela mesma sala, horas antes.

E gritou uma vez mais:

- Minha filha, achei! Achei!... Sou um homem realizado!...

Acudiu a bondosa senhora, em "negligé" com a "Gazeta da Alvorada" numa mão e o "Templo" na outra.

- Que se passa, meu bem? É tão tarde...

- Tarde? - retorquiu D. Nuno. Mais vale tarde do que nunca...
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...serei o D. Afonso Henriques da imprensa (...) O Verás Medreiros está velho, já não conta...

- Mas querido Nuno, então e aquelas crónicas contra os monopólios?...

- Rasgam-se, minha filha, rasgam-se..."

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Adé, apóstolo da "dóci língu maquista"


A Câmara Municipal de Oeiras fez saber com que trovadores irá concluir, no Parque dos Poetas, a sua homenagem aos maiores das Letras Bonitas escritas em português. E, na lista das presenças a haver, entre muitos que nos honram, encontro José dos Santos Ferreira, Adé para os amigos, poeta praticante, nascido à beira do Rio das Pérolas, a dois passos de Sagres, na vizinha Macau, sob o signo do horóscopo chinês que o determinou "amante incondicional do belo, perfeccionista, minucioso".

Era meu Amigo. Esqueçam, por isso, a saudade com que dele escrevo.

Diz Verónica Ganizo, no prefácio de um livro de José dos Santos Ferreira, que foi "um mágico indiano, carregado de aventuras mirabolantes, que, sem o sonhar, teve a culpa dos seus primeiros versos, ao fasciná-lo durante horas":

Co ôlo di nhum brejéro
Pê grándi, braço cumprido,
Sa dedo di mám ligéro
Bariga di nhum nutrido

Pashá fazê nôs olá
Laia-laia di avaria
Tánto palma já panhá
Pa tanto magicaria

Vou aos canhenhos, lembro o homem e o amigo que um dia conheci, à hora do chá, em casa do Stanley Ho dos casinos, na Cidade do Nome de Deus, e aí vai o que dele dizem os documentos pessoais que ficaram e os testemunhos resguardados de tufões, porque espalhados por locais do mundo onde os ventos são delicados e passam ao lado dos arquivos.

Adé (José Inocêncio dos Santos Ferreira) rasgou o olhar para a luz do dia em Macau, em Julho de 1919, filho de Florentina Maria, natural de Macau, e de Francisco dos Santos Ferreira, nado em Seia. Foi o décimo oitavo e último filho das segundas núpcias de D. Florentina, que teve nove descendentes de cada casamento.

Mai
Vôs já falá tanto vez
Qui nadi largá iou oncôm;
Vôs já prometê
Lôgo têm na iou-sa lado
Tudo ora, tudo sempri!

Diz-se que o pai viajou para Macau nos finais do século XIX, como militar. Entretanto, em 1918, viram-no dono de uma mercearia local ("A Portuguesa"), onde se comercializavam "portuguesíssimos vinhos, chouriços, queijos, bacalhau, azeite e feijão, entre outros produtos expressamente importados do Reino, e depois da República." O estabelecimento situava-se na Rua do Campo e era, ao tempo - consta -, o único do género.

As crónicas registam pai Ferreira como um homem generoso que "quando trespassou a mercearia, levou para casa uns restos de feijão e sacos cheios de vales que jamais se converteram em dinheiro", depois do que parte para Timor, sem família e sem cheta. Em cinco anos, contudo, prospera, mas acaba por morrer só e longe dos seus. Adé, filho de pai finalmente abastado, vai crescer assim, rodeado de parcos recursos materiais, cumprindo a vida "nos infinitos".

Inda se eu fosse poeta
Faria versos bonitos
P'ra agradar o meu sobrinho
Que mora nos infinitos, disse-lhe um dia o tio.

Como quase sempre, do nada vai surgir um poeta, segundo Alberto Estima de Oliveira, "intimista, escrevendo por dentro do que o seu olhar alcança. mondando o campo na busca de algo que multiplique a sua fé, religiosidade com que, com o maior carinho, alimenta o sonho e a vida."

Aos sete anos aprende a ler e a contar com uma mestra macaense que cobrava três patacas por mês, e por menino, para ensinar o que sabia. A instrução primária fê-la Adé na Escola Central de Macau, na época, instalada num antigo casarão na Rua do Gamboa, que servia, de graça, em cantina anexa, pequeno almoço e almoço.

Em 1931,matricula-se no liceu, onde permanece até ao 5º ano, estudando com livros emprestados e sem dinheiro para as propinas. Com dezassete anos deixa a escola e procura emprego. Desempenha funções de amanuense das Obras Públicas, a ganhar trinta patacas por mês, e, mais tarde, de fiscal de obras, já contra cento e dez patacas como salário mensal.

Cumpre serviço militar entre 1939 e 1940 e volta ao quartel aquando da Guerra do Pacífico, para novos seis meses de tropa.

Foi da secretaria dos Serviços de Saúde de Macau e, em 1956, assinála-se-lhe a presença como chefe da secretaria do liceu em que estudara. Os rendimentos, todavia, continuam escassos e decide-se, por isso, nas horas vagas, pelo ensino da nossa língua a chineses, pelas traduções do que lhe aparece e pelo mourejar na redacção de jornais.


Em 1964, aposenta-se da função pública e aceita o lugar de secretário da STDM - Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, passando a trabalhar à ilharga do patrão dos casinos, Stanley Ho.


Sabe-se que integrou a Mesa Directora da Santa Casa da Misericórdia durante oito anos e que foi presidente do Rotary Clube de Macau, em 1977/78.


Cavaleiro da Ordem do Infante D. Henrique, em Junho de 1979, distinguido com a medalha de Mérito Desportivo, em Fevereiro de 1983 e com a medalha de Mérito Cultural do território, em Junho de 1984, o que é verdadeiramente importante no seu "curriculum" é a obra que nos deixou, em prosa e em verso, sobretudo, em "patois" macaense, que o vai levar ao Parque dos Poetas e o consagra na nossa memória.


Discalço ta vai fónte
Leonor pisá chám esverdeado;
Quelê formosa, ta vai co cuidado.


Na cabéça, unga pote piquinino,
Na mám di prata su támpa;
Cinta di chita vemêlo fino
Co saia di séda estámpa,
Colete di tudo dia vestido,
Más branco que neve caído
Quelê formosa, ta vai co cuidado.


Xale abrí, mostrá piscoço,
Co trança di cabelo dorado
Prendido co listám sedoso.
Di bunita qui mundo ficá ispantado.
Caído nêle tánto doçura,
Pa dá graça sa formosura,
Quelê formosa, ta vai co cuidado.

Até sempre, caro Amigo! Ver-nos-emos. Portugueses.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Frases


"...nada há encoberto que não haja de ser descoberto; nem oculto, que não haja de ser sabido."

in Evangelho segundo S. Lucas 12.2

Eram onze, menos um do que os Apóstolos - diz-se


Eram onze. Onze irmãos. Já tinham partido dez até anteontem. Em paz, quase todos. Ou todos, mesmo. Que deixaram descendência digna. Gente de trabalho, que do trabalho viveu. O que deixaram ainda hoje cheira a suor. E anda no ar a sua voz, o seu sorriso, a sua alegria, a sua fraternidade simples. Calejada. Há, na maioria dos casos, no campo, árvores que os conheceram, árvores que ficaram assim numa espécie de guarda de honra à beira dos caminhos por onde passaram. Há veredas com pegadas suas. Conhecem-se fontes e águas do Zêzere que os procuram por todo o lado, numa correria incessante. Andam por cima da aldeia nuvens brancas que mais parecem cavalos alados com gente bordada a prata e ouro, ouro do sol, todas as manhãs.

Partiu agora a 11ª. A que ficara, e era a mais nova. Infelizmente, sem descendentes. Não há quem a represente directamente nos que ficaram. Há sobrinhos. Que a viram sofrer de solidão.
A ela que era "a mais nova", quiçá, a mais bonita de todas.Terá ido hoje a enterrar. No meio de silêncios. Tinha ouros, sabe-se. Tinha casa, é público. Alguém se vai chegar, ou chegou, à frente, de certeza. É assim em todas as famílias.

Uns com lógica, outros com falta dela. Uns rezam, outros rezaram-lhe... É da vida. Mas, dizem, uns irão para o Paraíso, outros para o Tormento das Labaredas.

Uma coisa é certa, há, por cima das nuvens, onze irmãos, de mãos dadas, a olhar cá para baixo...

Fuja, se puder, quem estiver em pecado.

O que dirão, Deus o sabe.

Que fique a mensagem para todos: a arca tem pão para os bons. E sol, e lua, e flores do campo, e broa fresca. E, apesar de tudo, caminhos sem ervas daninhas. Para ti, e para ti, e para ti (e para ti também, se te redimires das tuas falhas).

Vale o sorriso de todos os de boa fé - que foram ou que ficaram. E perceberam tudo.

Porquê a NET hoje?-perguntar-se-á.

Porque na NET está o mundo. E o mundo é assim. Quando surge sem burcas.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Recortes


BEM-FAZER



in Boletim Paroquial de Vila Nova de Ceira, "O Varzeense", de 15.3.1988


"Do nosso conterrâneo sr. Manuel Joaquim Alves de Almeida, chegado em princípio do ano do Brasil, recebemos a seguinte carta, de que damos conhecimento aos leitores:


Exmos. Senhores:


Pela presente sou a informar o seguinte:


Pelo ex.mo sr. Onoris Causa, no Grau de Comendador, Alvaro Alves de Almeida, natural de Relvas, freguesia de Cadafaz e concelho de Góis e residente no Rio de Janeiro (Brasil), em uma recente visita que fiz, de onde cheguei no dia 18 do corrente mês, o mesmo senhor me encarregou de solicitar a v. ex.as para fazer a distribuição da modéstia quantia de Esc. 7 000$00, para os seguintes fins:


Bombeiros Voluntários de Góis, 750$00; Grupo dos Sábados (Padre Vicente), 750$00; Rancho Folclórico de Cadafaz, 750$00; Rancho Folclórico Serra do Ceira, 500$00; Hospital da Misericórdia de Arganil, 750$00; Hospital da Misericórdia da Lousã, 500$00 (a); obras da Igreja de vosso conceituado jornal e pagamentos de jornais recebidos e a receber, a quantia de 2000$00. Total, 7000$00.



(a) - A oferta ao H.M. da Lousã é em virtude do mesmo senhor possuir uma firma no Rio de Janeiro, no Brasil, designada pelo nome de Lousã - Aparelhos Electrónicos, Lda.


Aproveito para vos desejar um bom Ano Novo e queiram aceitar os meus melhores cumprimentos.


...Atentamente, - Manuel Joaquim Alves de Almeida.


Em nome dos contemplados a quem fazemos a entrega, o nosso obrigado e votos de felicidades para os dois conterrâneos."

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Bordéus 2004 - apontamentos (III)


FINGIR DE EMIGRANTE...



"No autocarro cheio, um miúdo dos seus 15 anos, vendo-me, a seu lado, de pé, não retirou um saco do lugar perto daquele onde ía sentado. Por gestos inequívocos, solicitei-lhe que o fizesse e me deixasse sentar. Fê-lo um tanto contrariado, ante o olhar dos passageiros da frente - discretamente sorridentes..."


"No edifício do consulado de Portugal, a bandeira nacional estava hasteada ao contrário..."


"Muitas das rampas dos passeios de acesso às ruas têm tapetes antiderrapantes"


"No jardim Charles De Gaulle, nas traseiras do Centro Comercial Meriadeck, há um busto de homenagem ao cônsul português, Aristides de Sousa Mendes, escultora Margarida Santos - 1994."


"A igreja de S. Marcial, fica no largo com o mesmo nome. É uma igreja modesta, cujo edifício domina o largo, para o qual, aliás, está de costas."


"O salário mínimo em França é (era...) 1000 euros"


"Um fulano com bom aspecto pediu-me dinheiro para uma sopa."


"Vi mais cães do que mulheres grávidas. Ao fim de uma hora de observação, ainda só tinha visto passar duas..."


"Durante 2 horas de "estacionamento" na esplanada, passaram à minha frente umas 3 pessoas a falar ao telemóvel."


"Debaixo do silo automóvel Victor Hugo, no edifício que integra o Palácio dos Desportos, alguns vagabundos fizeram a sua casa com cobertores."


"Pouca gente a fumar. Raras as pontas de cigarro no chão."

Filhos, árvores e livros


Tão seco de carnes como eu escasso de cabelos, encontrei ontem à tarde, Joe Berardo, no seu Jardim Oriental Buddka Eden, na Quinta dos Loridos, no Bombarral. Já não o via desde o início dos anos 80, em Joanesburgo, andava eu numa volta ao Mundo, quando me falou na hipótese de haver petróleo na Madeira...

Cruzámo-nos agora com a mesma cordialidade com que nos conhecemos. Melhor: uma nota de rodapé, que, no fundo, é tudo:

eu reconheci o cidadão e a falei da sua obra; ele não se lembrava de mim, mas tinha ideia de um livro meu...

Somos "sócios". Eu dou-me como plantador de uma árvore, pai e autor de obra escrita, aceitando que Berardo entre com os bens que se lhe conhecem...

Tá fêto...

O caloroso abraço que demos selou o essencial. Entretanto, pode ficar aqui no Registo Civil da INTERNET...

O homem que apareça só para assinar, não acham? Não é pressa. Se quiser, pode até fazer-se representar...C'os diabos!... Os amigos são para as ocasiões.

Jardim Oriental


Passados cerca de 30 anos sobre a manhã em que tive oportunidade de o ouvir no seu gabinete em Joanesburgo, reencontrei ontem à tarde, no Jardim Oriental Budddha Eden, na sua Quinta dos Loridos, no Bombarral, o Comendador Joe Berardo, a quem nunca mais pusera a vista em cima...Achei-o tão seco de carnes, quanto eu escasso de cabelos. Mas afectuoso, cordial mesmo, como o conheci.

Recordámos o encontro na África do Sul e feitas as apresentações da família que me acompanhava, dissemos adeus. Significativamente, Berardo com vénia e mãos postas, num ambiente de grande concentração budista. E a maior simplicidade.

Até sempre!

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

"Quarto de Despejo" - livro realista


Sem comentários. Estou velho para começar tudo de novo... Decidam vocês e não me chateiem... Se não viram o que dão as soluções que os governantes nos apresentaram, vissem... Entretanto, prometi trazer para aqui os depoimentos da Catarina...Cá têm mais um dos que conseguiram, pelo menos, uma leitora... O que, além do mais, dá garantias (é mãe) de continuidade...

in "Quarto de Despejo":

"...Deixei o leito furiosa. Com vontade de quebrar e destruir tudo. Porque eu tinha só feijão e sal. E amanhã é domingo.

...Fui na sapataria retirar os papéis. Um sapateiro perguntou-me se o meu livro é comunista. Respondi que é realista. Êle disse-me que não é aconselhável escrever a realidade."

Páginas negras


"A 13 de Agosto de 1961, guardas da República Democrática Alemã (RDA) começaram a fechar com arame farpado e cimento armado a fronteira que separava as partes oriental e ocidental de Berlim, bem como Berlim Ocidental do território da Alemanha Oriental."

"As Brigadas Vermelhas assassinaram o antigo primeiro-ministro Aldo Moro, com 11 tiros de pistola automática. O seu corpo, manchado de sangue, foi encontrado no interior de uma viatura estacionada no centro de Roma, entre as sedes da Democracia Cristã e do Partido Comunista."

"1989 - O Brasil já destruiu 343 900 quilómetros quadrados de selva amazónica, cerca de quatro vezes a área territorial de Portugal continental."

Frases


"É preciso ter a coragem de dizer que nazismo, fascismo, Rússia marxista ou América capitalista terão sido, em graus diferentes e por caminhos opostos, não mais do que rivais lançados na mesma corrida."

René Huyghe, professor do Colégio de França e Conservador-chefe honorário do Museu do Louvre in "Diálogo com o Visível"

Bordéus 2004 - apontamentos (II)


FINGIR DE EMIGRANTE...

"No "tramway", penso que novo (3 linhas), pode ler-se, no interior, por cima do desenho de um cigarro, cruzado a vermelho, a legenda: "No combóio eu respiro." E outra, por cima de um boneco, dando a entender que alguém está com os pés em cima das cadeiras, o seguinte "alerta":
"preserve o seu combóio."

"Os imigrantes em Bordéus são, principalmente, da Argélia, Marrocos e Tunísia..."

"Os muçulmanos declaram-se em maioria no mundo (75%)."

"Acham que, em França, a questão dos véus das muçulmanas é alimentada pela comunicação social."

"Um tunisino, considera Bordéus mais seguro do que Paris ou Marselha."

"Ao 5º dia em Bordéus ainda não dei conta de qualquer informação a recomendar cuidados especiais com os gatunos."

"Os cães, com trela, podem andar nos autocarros."

"Não se ouve businar."

"Vi poucos polícias, mas, os que vi, iam em grupos de três, com um "ar respeitável".

"Aproveitando o facto de a cidade ser plana, muita gente anda de bicicleta (às vezes, com crianças atrás)."

"A meio da tarde, de repente, ao entrar no autocarro quase cheio, sobretudo de jovens, dei-me conta de que a cor dominante do vestuário era preta ou cinzenta."

"Comprámos peixe cerca de 30% mais caro do que em Portugal."

"O bacalhau, nas lojas portuguesas, era mais barato do que em Portugal."

"Os homens usam blusões. Não me lembro de os ver engravatados."

"Numa importante avenida de Bordéus, uma idosa encostou-se à janela de uma cave, deu um certo jeito à saia e...mijou, com o ar mais tranquilo do mundo. Ainda lhe consegui ver "o rasto" na parede..."

"Casas de banho públicas por 60 cêntimos, com direito a instalações higienizadas, papel higiénico, água para lavar as mãos e secador. Espelho. Tudo até 15 minutos por utente, sem que a porta se abra..."

"O Consulado de Portugal fica ao pé de um jardim público, perto do Museu de Arte Contemporânea, numa rua que, perguntados, dois ou três locais, não conhecem."

"Numa das zonas vinhateiras mais ricas do mundo, os "drogados" quase não se vêem. Provavelmente, são bêbados..."

Direi mais...

Fases e frases


Manuel de Oliveira in "Memórias e Autobiografia de um Emigrante"

"O tipo, vestido de branco com calças pretas e uma risca a brilhar, traz-nos uma garrafa de vinho espumante, muito bem agasalhado numa toalha branca... O outro companheiro encarregou-se de nos servir uma espécie de concha do mar, cheia com um pouco de peixe ralado com salsa. Que, apesar de ser pouco, ficou ali todo.Terminada que foi esta cerimónia, preparámo-nos para pedir a conta. E com as mesmas palavras: "Monsieur, s'il vous plaît", a conta foi-nos entregue. 3 500 francos, que pagámos, honradamente, por nos atenderem. Porém, o pior estava à nossa espera, precisamente ao princípio da escada. Uma espécie de enfermeira, vestida de branco, segurava a nossa gabardine pronta a servir. Outra segurava o chapéu e outra mais, o guarda-chuva. Cada uma delas repetia a mesma música: "s'il vous plaît, merci, merci, merci...".

Cada uma delas pretendia uma nota de 100 francos, nada menos. Mas como tivessemos muitos trocados, demos-lhes a uma delas, uma moeda muito leve, creio que 25 francos. Aí a música dobrou, pois ela nem lhe pegou, e continuou no nosso rasto, repetindo uma e outra vez "S'il vous plaît, s'il vous plaît...", quase a tirar-nos as últimas moedas dos bolsos. Sem mais aquelas, agarrei num punhado de francos do bolso e pousei-os, cintilando sobre a mesa, dizendo em Francês-Português-Castelhano: "C'est fini, não tener más".

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Bordéus 2004 - apontamentos (I)


FINGIR DE EMIGRANTE...

"Adorei dormir no combóio."

"Não tenho a certeza se dormi..."

"O revisor deu-me duas garrafinhas de vinho do Porto, um saquinho de amendoins e duas amostras de chocolate de leite. Uma para mim, outra para minha mulher.
Viajámos os dois. Na mesma cabina, claro, para ser mais em conta..."

"Face à generalizada ameaça de terrorismo que paira no mundo ocidental, em particular, no TGV e, por certo, nos outros combóios franceses, não é permitido agora (2004) arrumar qualquer volume nas bagageiras que se encontram à entrada das carruagens. Puseram-lhes fitas vermelhas e brancas a sinalizar o local."

"A viagem faz-se no dia em que, à União Europeia, aderem mais 10 países. Passam a ser 25!"

"As ruas em Bordéus parecem-me avenidas."

"O local onde fica o aparhotel, pelo menos, ao fim-de-semana, é frequentado por gente do Norte de África - e tem muita merda de cão nos passeios"

"Papel no formato A4 colado numa porta: "A maré desce e a merda cresce."

"Quase nada custa cêntimos... Mesmo nas zonas menos frequentadas por emigrantes africanos e asiáticos, percebe-se isso..."

"É vulgar as coisas custarem mais 20 ou 50% do que em Portugal."

"É um susto chegar com o nosso nível de vida e "ter que" enfrentar o nível francês..."

"Na gare da estação principal do caminho de ferro de Bordéus, a bandeira, a única bandeira, hasteada por cima da entrada principal é a da União Europeia. Numa das avenidas de acesso à estação, contudo, nem mesmo em edifícios públicos há outra bandeiras que não a francesa."

"A dois passos do Largo Vitória (que é um dos mais movimentados da cidade) há uma loja portuguesa (no Cours de le Marne) que vende jornais e produtos nossos..."

Direi mais...

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